
Parecer 8302/2022
Texto Completo
PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 3071/2022
AUTORIA: DEPUTADO GUSTAVO GOUVEIA
PROPOSIÇÃO QUE INSTITUI A POLÍTICA ESTADUAL DE CUIDADOS ÀS PESSOAS COM TRANSTORNO DE ACUMULAÇÃO COMPULSIVA DE ANIMAIS. DEFESA E PROTEÇÃO DA SAÚDE. MATÉRIA INSERTA NA COMPETÊNCIA ADMINISTRATIVA COMUM (ART. 23, II, CF/88) E LEGISLATIVA CONCORRENTE (ART. 24, VI, CF/88). DIREITO À SAÚDE (ART. 6º, CAPUT, C/C ART. 196 E SS., CF/88). PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE E A FAUNA (ART. 24, VI, C/C ART. 23, VI, CF/88). PRECEDENTES DESTA CCLJ. PELA APROVAÇÃO NOS TERMOS DO SUBSTITUTIVO.
1. RELATÓRIO
É submetido a esta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, para análise e emissão de parecer, o Projeto de Lei Ordinária (PLO) nº 3071/2022, de autoria do Deputado Gustavo Gouveia, que institui a Política Estadual de Cuidados às Pessoas com Transtorno de Acumulação Compulsiva de Animais no Estado de Pernambuco.
O autor da proposição, na justificativa, destaca a necessidade de proteger a saúde das pessoas e a do animais, nos seguintes termos:
O comportamento de acumular prejudica diversos aspectos da vida cotidiana da pessoa acometida, e os indivíduos portadores do transtorno de acumulação muitas vezes acabam se isolando e evitando o contato com as demais pessoas de sua comunidade
No caso específico do acúmulo de animais, estes são mantidos por indivíduos que sofrem deste transtorno em um local com padrões sanitários precários, privados de alimentação e cuidados veterinários adequados, o que pode caracterizar maus tratos, oferecendo risco de proliferação de zoonoses aos animais e à comunidade ao redor.
Casos de transtorno de acumulação de animais estão se tornando mais comuns, o que exige a rápida identificação, diagnóstico e intervenção por profissionais especializados a fim de se garantir aos indivíduos que sofrem deste distúrbio o acesso a um tratamento de saúde adequado, bem como evitar a disseminação de zoonoses à comunidade e a submissão de animais a maus tratos.
O Projeto em referência tramita nesta Assembleia Legislativa pelo regime ordinário (art. 223, III, Regimento Interno).
É o relatório.
2. PARECER DO RELATOR
Cabe à Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, nos termos do art. 94, I, do Regimento Interno desta Casa, manifestar-se sobre a constitucionalidade, legalidade e juridicidade das matérias submetidas à sua apreciação.
A proposição em análise encontram guarida no art. 19, caput, da Constituição Estadual e no art. 194, I, do Regimento Interno desta Assembleia Legislativa, uma vez que o deputado estadual detém competência para apresentar projetos de lei ordinária.
De partida, registre-se que esta Comissão já firmou entendimento pela viabilidade constitucional de projetos de lei de iniciativa parlamentar que instituam políticas públicas e/ou estabeleçam diretrizes para estas, desde que não promovam aumento de despesa pública e não interfiram nas atribuições dos órgãos vinculados ao Poder Executivo.
Nesse sentido, apenas para citar precedentes recentes, observam-se os Pareceres nº 4352/2020, aprovou, nos termos do Substitutivo apresentado, os PLOs nº 1523/2020 e 1524/2020, os quais estabeleciam diretrizes para as campanhas públicas de combate ao racismo; nº 4919/2021, aprovou o PLO nº 1390/2020, que institui a Política de Atenção à Oncologia Pediátrica de Pernambuco, e o nº 4921/2021, aprovou o PLO 1456/2020, que institui a Política Estadual de Enfrentamento ao Mal de Alzheimer.
Ora, os fundamentos jurídicos que subsidiaram a aprovação dos projetos mencionados, com as devidas adequações, são indicativos que a proposição ora analisada também encontra supedâneo para a sua aprovação, pois esta tem o objetivo de estabelecer diretrizes para a atuação do Poder Público, sem adentrar em ações concretas ou esmiuçar atribuições de órgãos públicos.
Nesse contexto, louva-se a fundamentação jurídica utilizada nos pareceres mencionados para entabular a presente fundamentação, conforme exposto a seguir.
É de bom tom, em breve definição, destacar que as políticas públicas são tidas como “programas de ação governamental visando a coordenar os meios à disposição do Estado e as atividades privadas para a realização de objetivos socialmente relevantes e politicamente determinados.” (BUCCI, Maria Paula Dallari. Direito Administrativo e Políticas Públicas. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 241).
Assim, é possível inferir que o PLO 3071/2022 trata essencialmente de política pública, a qual deve guardar observância com as demais regras de repartição constitucional de competências e hipóteses de iniciativa reservada ou privativa.
No âmbito das competências administrativas e legislativas dos entes federativos, observa-se que a proposição em análise encontra supedâneo nos seguintes dispositivos da Constituição Federal:
Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:
[...]
II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;
[...]
VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas;
VII - preservar as florestas, a fauna e a flora;
[...]
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
[...]
VI - florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição;
[...]
VIII - responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;
[...]
XII – previdência social, proteção e defesa da saúde;
No que tange à constitucionalidade material, frise-se que há total consonância com os preceitos constitucionais previstos no art. 6º, caput, e no art. 196 do Texto Máximo, conforme se observa:
Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
Art.196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença, e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
Reitere-se que a proposição não versa sobre a criação, reestruturação ou extinção de órgãos ou entidades do Poder Executivo, de modo que pudesse caracterizar afronta à iniciativa legislativa do Governador do Estado.
O Projeto de Lei em análise, na parte mantida pelo Substitutivo desta CCLJ, tão somente relaciona diretrizes, objetivos e finalidades a serem adotadas por parte do Poder Público em relação às políticas públicas voltadas às pessoas com Transtorno de Acumulação Compulsiva de Animais. Desta forma, com o Substitutivo abaixo apresentado, retiramos dispositivos de caráter meramente autorizativo e que poderiam ensejar questionamentos acerca da necessidade de novos treinamentos e atribuições a serem realizados pelo Poder Executivo.
Por ser a Função Legislativa atribuída, de forma típica, ao Poder Legislativo, as hipóteses de iniciativa privativa do Governador são taxativas e, enquanto tais, são interpretadas restritivamente. Sobre o tema:
“A iniciativa reservada, por constituir matéria de direito estrito, não se presume e nem comporta interpretação ampliativa, na medida em que, por implicar limitação ao poder de instauração do processo legislativo, deve necessariamente derivar de norma constitucional explícita e inequívoca” (STF, Pleno, ADI-MC nº 724/RS, Relator Ministro Celso de Mello, DJ de 27.4.2001 (original sem grifos).
“(...) uma interpretação ampliativa da reserva de iniciativa do Poder Executivo, no âmbito estadual, pode resultar no esvaziamento da atividade legislativa autônoma no âmbito das unidades federativas.” (STF - ADI: 2417 SP, Relator: Min. Maurício Corrêa, Data de Julgamento: 03/09/2003, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJ 05-12-2003)
Desse modo, não estando a matéria no rol das afetas à iniciativa privativa do Governador do Estado, franqueia-se ao parlamentar a legitimidade subjetiva para deflagrar o correspondente processo legislativo, com as ressalvas feitas no Substitutivo abaixo apresentado. Infere-se, portanto, que não há vício de iniciativa na proposição ora analisada após as alterações promovidas.
Assim sendo, propomos o seguinte Substitutivo:
SUBSTITUTIVO Nº /2022 AO PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 3071/2022
Altera integralmente a redação do Projeto de Lei Ordinária nº 3071/2022, de autoria do Deputado Gustavo Gouveia.
Artigo Único. O Projeto de Lei Ordinária nº 3071/2021 passa a ter a seguinte redação:
Institui a Política Estadual de Cuidados às Pessoas Portadoras de Transtorno de Acumulação Compulsiva de Animais.
Art. 1º Esta lei institui a Política Estadual de Cuidados às Pessoas com Transtorno de Acumulação Compulsiva de Animais no Estado de Pernambuco.
Art. 2° Para fins de aplicação desta Lei, considera-se pessoa com Transtorno de Acumulação Compulsiva de Animais, aquelas que apresentam comportamento psicopatológico de acumular um número crescente de animais domésticos para si de forma compulsiva, não se atentando para condições mínimas de higiene do local onde os animais são mantidos, privando-os de cuidados veterinários e alimentação adequada, não aceitando a necessidade de destiná-los à adoção e se negando a reconhecer a forma precária em que vivem e como isto implica em seu bem-estar e no meio ambiente ao redor.
Parágrafo único. O acúmulo de animais se caracteriza como a concentração excessiva de animais domésticos no mesmo local e o não oferecimento de condições mínimas de bem estar, gerando sofrimento a eles e ao próprio tutor.
Art. 3° São Diretrizes da Política Estadual de Cuidados às Pessoas com Transtorno de Acumulação Compulsiva de Animais:
I - facilitação dos cuidados necessários à saúde física e emocional das pessoas portadoras deste comportamento patológico;
II - redução dos riscos de transmissão de zoonoses e minimização dos problemas ambientais decorrentes do acúmulo de animais;
III - promoção do bem estar animal; e
IV - incentivo ao restabelecimento dos vínculos sociais e comunitários das pessoas diagnosticadas após o tratamento.
Art. 4° A Política Estadual de Cuidados às Pessoas com Transtorno de Acumulação Compulsiva de Animais deverá prever a execução das seguintes ações:
I - identificação de casos de acumulação de animais;
II - diagnóstico do Transtorno de Acumulação Compulsiva de Animais por equipe multidisciplinar da rede pública estadual de saúde;
III - garantia das intervenções profissionais necessárias e acesso aos transtornos indicados por meio da rede pública estadual de saúde;
IV - acolhimento dos animais e disponibilização dos cuidados veterinários necessários; e
V - encaminhamento para adoção responsável;
Art. 5° Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Assim, o parecer do Relator é pela aprovação do Projeto de Lei Ordinária nº 3071/2022, de iniciativa do Deputado Gustavo Gouveia, nos termo do Substitutivo.
É o Parecer do Relator.
3. CONCLUSÃO DA COMISSÃO
Ante o exposto, tendo em vista as considerações expendidas pelo relator, a Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, por seus membros infra-assinados, opina pela aprovação do Projeto de Lei Ordinária nº 3071/2022, de iniciativa do Deputado Gustavo Gouveia, nos termos do Substitutivo.
Histórico