
Parecer 8109/2022
Texto Completo
PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 2349/2021
AUTORIA: DEPUTADA ALESSANDRA VIEIRA
PROPOSIÇÃO QUE INSTITUI A POLÍTICA ESTADUAL DE TRATAMENTO DAS PESSOAS VÍTIMAS DE QUEIMADURAS E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS. COMPETÊNCIA LEGISLATIVA CONCORRENTE DA UNIÃO, DOS ESTADOS E DO DISTRITO FEDERAL PARA DISPOR SOBRE PROTEÇÃO E DEFESA DA SAÚDE (ART. 24, XII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL). INEXISTÊNCIA DE VÍCIOS DE INCONSTITUCIONALIDADE, DE ILEGALIDADE OU DE ANTIJURIDICIDADE. PELA APROVAÇÃO, NOS TERMOS DO SUBSTITUTIVO DESTE COLEGIADO.
1. RELATÓRIO
É submetido a esta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, para análise e emissão de parecer, o Projeto de Lei Ordinária nº 2349/2021, de autoria da Deputada Alessandra Vieira, que institui a Política Estadual de Tratamento das Pessoas Vítimas de Queimaduras e dá outras providências (art. 1º).
O art. 2º da proposição estabelece tratamento prioritário para os beneficiários da proposição. Em seguida, o art. 3º garante o direito a órteses, próteses e outros equipamentos necessários à recuperação do paciente. Por fim, o art. 4º estabelece a necessidade de ações para possibilitar o retorno ao convívio social e profissional dessas pessoas.
O Projeto de Lei em referência tramita nesta Assembleia Legislativa pelo regime ordinário (art. 223, inciso III, Regimento Interno).
É o relatório.
2. PARECER DO RELATOR
Cabe à Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, nos termos do art. 94, inciso I, do Regimento Interno desta Casa, manifestar-se sobre a constitucionalidade, legalidade e juridicidade das matérias submetidas à sua apreciação.
A proposição tem como objetivo estabelecer política estadual voltada ao atendimento de pessoas com sequelas de queimaduras, a fim de promover sua reabilitação física, estética, psicológica, educacional e profissional.
Sob o prisma da competência formal orgânica, a proposição em apreço encontra fundamento na competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal, prevista no art. 24, XII, da Constituição Federal, segundo o que:
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
[...]
XII - previdência social, proteção e defesa da saúde;
No mesmo sentido, segue entendimento do Supremo Tribunal Federal:
“LEI DISTRITAL. NOTIFICAÇÃO MENSAL À SECRETARIA DE SAÚDE. CASOS DE CÂNCER DE PELE. OBRIGAÇÃO IMPOSTA A MÉDICOS PÚBLICOS E PARTICULARES. ADMISSIBILIDADE. SAÚDE PÚBLICA. MATÉRIA INSERIDA NO ÂMBITO DE COMPETÊNCIA COMUM E CONCORRENTE DO DISTRITO FEDERAL. ARTS 23, I, E 24, XII, DA CF. RESPONSABILIDADE CIVIL DOS PROFISSIONAIS DA SAÚDE. MATÉRIA DE COMPETÊNCIA EXCLUSIVA DA UNIÃO. ART. 22, I. PROCEDÊNCIA PARCIAL DA AÇÃO. I – Dispositivo de lei distrital que obriga os médicos públicos e particulares do Distrito Federal a notificarem a Secretaria de Saúde sobre os casos de câncer de pele não é inconstitucional. II – Matéria inserida no âmbito da competência da União, Estados e Distrito Federal, nos termos do art. 23, I, da Constituição Federal. III – Exigência que encontra abrigo também no art. 24, XII, da Carta Magna, que atribui competência concorrente aos referidos entes federativos para legislar sobre a defesa da saúde. IV – (...). V – Ação direta parcialmente procedente.” (STF - ADI 2.875, Plenário, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 4-6-2008, DJE 20-6-2008). (Grifo nosso).
Destacamos ainda a Súmula nº 18 do TJPE, que assim prescreve:
Enunciado: É dever do Estado-membro fornecer ao cidadão carente, sem ônus para este, medicamento essencial ao tratamento de moléstia grave, ainda que não previsto em lista oficial.
A Corte estadual aplica esse entendimento inclusive para outros tratamentos de saúde em geral, além do conceito estrito de “medicamento”, a exemplo do fornecimento de próteses. Nesse sentido, citamos o seguinte acórdão do TJPE, que determinou o fornecimento desse equipamento:
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE ESFÍNCTER PARA CONTROLE DA INCONTINÊNCIA URINÁRIA. DEVER DO ESTADO. PACIENTE PORTADOR DE CÂNCER DE PRÓSTATA COM INDICAÇÃO DE USO DE ENDOPRÓTESE PARA CONTROLE DA PATOLOGIA. PRELIMINAR DE FALTA DE INTERESSE DE AGIR. REJEIÇÃO. TUTELA JURISDICIONAL ÚTIL, NECESSÁRIA E ADEQUADA À PROTEÇÃO DO DIREITO DO AUTOR. MÉRITO. LAUDO MÉDICO QUE DEMONSTRA A NECESSIDADE DE OBTENÇÃO DO MATERIAL E DA CIRURGIA PARA SUA COLOCAÇÃO. MULTA COMINATÓRIA DIÁRIA (ASTREINTES). AUSÊNCIA DE EXCESSIVIDADE. NECESSIDADE, NO CURSO DO PROCESSO, DE MAJORAÇÃO, PELO DESCUMPRIMENTO DO PRECEITO POR PARTE DO ESTADO. SITUAÇÃO QUE PODE SER MODIFICADA A QUALQUER TEMPO CASO SE COMPROVE EXCESSO OU INIQUIDADE. PRUDÊNCIA NA MANUTENÇÃO. APELAÇÃO IMPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA. DECISÃO UNÂNIME. (Apelação Cível 506144-10044779-04.2014.8.17.0001, Rel. Josué Antônio Fonseca de Sena, 4ª Câmara de Direito Público, julgado em 04/03/2020, DJe 18/08/2020)
Quanto ao tema da iniciativa, da constitucionalidade formal subjetiva, importante destacar a argumentação elaborada no Parecer ao PL 1390/2020, onde foi superado o entendimento clássico desta Comissão no sentido da inviabilidade de projetos de iniciativa parlamentar que instituíssem políticas públicas. No PL ora examinado, percebe-se que a presente proposição não versa sobre a criação, reestruturação ou extinção de órgãos ou entidades do Poder Executivo, em modo que pudesse caracterizar afronta à iniciativa legislativa do Governador do Estado.
O Projeto de Lei em análise apenas relaciona providências a serem adotadas por parte do Poder Público em relação às pessoas com sequelas graves advindas de queimaduras. As diretrizes, objetivos e finalidades da política podem ser atingidas por meio da estrutura pré-existente no âmbito do Poder Executivo.
A implantação, a coordenação e o acompanhamento da Política ainda ficarão a cargo do órgão competente do Poder Executivo, a quem incumbirá, também, promover concretamente às ações previstas na proposição, mediante conveniência e oportunidades administrativas.
Desse modo, não estando a matéria no rol das afetas à iniciativa privativa do Governador do Estado, franqueia-se ao parlamentar a legitimidade subjetiva para deflagrar o correspondente processo legislativo. Infere-se, portanto, quanto à iniciativa, a constitucionalidade formal subjetiva da proposição.
Devemos alertar, contudo, que a gestão e condução concreta das ações da política estadual da saúde são prerrogativas do chefe do Poder Executivo Estadual, motivo este que requer a modificação do projeto em análise a fim de retirar medidas que extrapolam a competência parlamentar.
No mesmo sentido, entendemos inadequada a disposição do parágrafo único do art. 1º que define o que se considera sequela grave. Com efeito, o estabelecimento de rol específico pode levar à interpretação excludente de pessoas que, de outra maneira, seriam abrangidas pela ação estatal. Assim, melhor que a definição não esteja fixada na lei.
Ademais, a proposição prevê a reabilitação educacional e profissional que, embora importantes, devem ser objeto de política própria. Nesse sentido, é de se pontuar que um dos serviços típicos do Regime Geral de Previdência Social é a reabilitação profissional (art. 18, III, ‘c’ da Lei Federal nº 8.213/1991), motivo pelo que não é desejável haver superposição de ações.
Diante disso, apresentamos o seguinte substitutivo:
SUBSTITUTIVO N° /2022 AO PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 2349/2021
Altera integralmente a redação do Projeto de Lei Ordinária nº 2349/2021.
Artigo único. O Projeto de Lei Ordinária nº 2349/2021 passa a ter a seguinte redação:
“Institui, no âmbito do Estado de Pernambuco, a Política Estadual de Tratamento das Pessoas Vítimas de Queimaduras e dá outras providências.
Art. 1º Fica instituída, no âmbito do Estado de Pernambuco, a Política Estadual de Tratamento das Pessoas Vítimas de Queimaduras, com objetivo de garantir reabilitação física, estética e psicológica.
Parágrafo único. A Política Estadual de Tratamento das Pessoas Vítimas de Queimaduras seguirá, tanto quanto adequadas, as diretrizes internacionais da Organização Mundial da Saúde e das Políticas Nacional e Estadual de Saúde.
Art. 2º O Estado, por meio de seus órgãos competentes e do Sistema Único de Saúde – SUS e da rede conveniada, sempre que possível, adotará e desenvolverá ações e programas de tratamento e reabilitação das pessoas vítimas de queimaduras, com ênfase na prioridade de atendimento da rede de serviços e cuidados assistenciais destinados a este fim, na perspectiva de possibilitar seu retorno ao convívio social e profissional.
Art. 3º As sequelas graves advindas de queimaduras receberão tratamento prioritário, na forma do regulamento.
Art. 4º Caberá ao Poder Executivo regulamentar a presente Lei em todos os aspectos necessários para a sua efetiva aplicação.
Art. 5º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. ”
Cabe às demais Comissões Permanentes deste Poder Legislativo, notadamente à Comissão de Saúde e Assistência Social, manifestarem-se quanto ao mérito da matéria sub examine, convocando, se necessário, os setores representativos diretamente afetados pela medida.
Diante do exposto, opino pela aprovação do Projeto de Lei Ordinária nº 2349/2021, de autoria da Deputada Alessandra Vieira, nos termos do substitutivo apresentado acima.
É o Parecer do Relator.
3. CONCLUSÃO DA COMISSÃO
Tendo em vista as considerações expendidas pelo relator, a Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, por seus membros infra-assinados, opina pela aprovação do Projeto de Lei Ordinária nº 2349/2021, de autoria da Deputada Alessandra Vieira, nos termos do substitutivo desta Comissão.
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