
PROJETO DE LEI ORDINÁRIA 1205/2020
Declara ser contrário ao interesse público, no âmbito do Estado de Pernambuco, por seus Poderes e entes despersonalizados, estabelecer ou manter relações contratuais ou institucionais com pessoa física ou jurídica que produza, reproduza ou patrocine direta ou indiretamente, desinformação, notícia falsa, destorcida, descontextualizada, que veicule discurso de ódio ou ofensa direta ou indireta a direitos humanos.
Texto Completo
Art. 1º Fica estabelecido que é contrário ao interesse público, no âmbito do Estado de Pernambuco, por seus Poderes e entes despersonalizados, contratar com pessoa física ou jurídica a veiculação, impulsionamento ou o patrocínio de qualquer dos seus conteúdos institucionais em qualquer meio de comunicação, que produza ou reproduza desinformação, notícia falsa, destorcida, descontextualizada, que veicule discurso de ódio ou ofensa direta ou indireta a direitos humanos.
Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei:
I – desinformação é o ato ou efeito de desinformar, de suprimir uma informação, de minimizar a sua importância ou de modificar o seu sentido ou contexto para contrariar a verdade, capaz de confundir ou de induzir ao erro.
II – notícia falsa é história inverídica que, ao manter a aparência de notícia jornalística ou assumir a forma de denunciação falsa de crime, é disseminada pela internet ou por outras mídias, visando influenciar posição política ou induzir comportamento antidemocrático, violento, lesivo ou perigoso, produzindo qualquer tipo de vantagem, econômica, pessoal, social, política ou eleitoral para o seu autor ou emissor.
III – direitos humanos são os direitos inerentes a todos os seres humanos, independentemente de sua sexualidade, origem, cor, etnia, idioma, religião ou qualquer outra condição garantida fundamental e universalmente, que visam proteger os indivíduos e grupos sociais contra as diversas ações ou omissões daqueles que atentem contra a dignidade da pessoa humana.
Art. 2º Não se confunde com desinformação ou notícia falsa, nos termos desta Lei, opinião e crítica, ainda que sem conexão com a verdade, desde que identifique claramente o emissor e o autor, em conformidade com o disposto no art. 5º, inciso IV da Carta Magna, de modo a dar oportunidade ao alvo do conteúdo, identificar, responder ou responsabilizá-los em juízo, caso se sinta ofendido.
Parágrafo único. A veiculação, reprodução ou compartilhamento de crítica de que trata o caput, deste artigo, que não identificar o autor da informação, fica equiparada a desinformação, notícia falsa ou ofensa a direitos humanos, conforme o caso, para todos os efeitos desta Lei.
Art. 3º Qualquer pessoa poderá comunicar a qualquer das autoridades públicas do Estado de Pernambuco a desinformação, notícia falsa ou ofensa aos direitos humanos, que, sendo confirmada, será remetida aos chefes dos Poderes Públicos e entes despersonalizados estaduais para adoção das providências cabíveis.
Parágrafo único. A autoridade pública, ao tomar conhecimento de algum ato de que trata esta Lei, através de qualquer meio, inclusive através da marcação em uma postagem em perfil de rede social, deverá comunicá-lo, de ofício, aos órgãos competentes para os encaminhamentos administrativos, penais, cíveis ou mais de um deles, conforme o caso.
Art. 4º É contrário ao interesse público do Estado de Pernambuco, no âmbito dos seus Poderes e entes despersonalizados, celebrar, manter contrato ou estabelecer qualquer relação institucional, tais como, inclusão ou manutenção em programas estaduais de benefícios fiscais, sociais ou econômicos, contratos de publicidade ou de publicidade programática, dentre outros, com pessoa física ou jurídica que:
I – produza ou reproduza notícia falsa, desinformação ou ofensa contra os direitos humanos;
II – patrocine, direta ou indiretamente, inclusive veiculando seus anúncios em espaços físicos ou virtuais em que haja disseminação de desinformação, notícia falsa, ou ofensa a direitos humanos.
§ 1º Na hipótese do inciso II, não sendo reincidente, ficará suspensa a relação institucional do Estado de Pernambuco enquanto persistir a situação de contrariedade ao interesse público, de que trata o caput deste artigo.
§ 2º A reincidência nos atos de que trata o caput deste artigo, implicará manutenção da vedação prevista, pelo prazo de 5 (cinco) anos.
§ 3º A rescisão de contratos vigentes, em virtude dos efeitos desta lei, levará consideração o disposto no inciso XII, do art. 78 e o art. 79, inciso I da Lei Federal 8.666 de 21 de junho de 1993.
Art. 5º Decreto do Poder Executivo regulamentará esta Lei em até 30 dias da data de sua publicação.
Art. 6º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Justificativa
É incontroverso que a desinformação, notícia falsa, destorcida, descontextualizada ou as ofensas aos direitos humanos têm protagonizado um veículo de desestabilização da ordem institucional em todo o País.
A luta contra a prática de disseminação de conteúdos de desinformação, noticias falsas, caluniosas, infamatórias, de propagação de discursos de ódio e ofensivo aos direitos humanos, é global. Ocorre que, sob a pseudoproteção do anonimato da internet, através de uso de perfis falsos, mascaramento do Internet Protocol (IP), ou Protocolo de Internet, que é uma espécie de identidade da conexão de acesso que pode identificar o emissor do conteúdo, algumas pessoas passaram a utilizar-se da rede mundial de computadores como meio para cometer crimes, na ilusão de não deixarem rastros.
A lentidão das ordens jurídicas em estabelecerem normas de proteção, de uso e de controle dos conteúdos, justificável pela preocupação em não lesar o direito fundamental ao exercício da liberdade de expressão, tornou, a internet, por um certo tempo, um território sem lei.
Mas o tempo chegou em que a jurisdição chegou à internet e vários mecanismos de controle de conteúdos estão sendo criados ao redor do mundo. Práticas como as fake news estão deixando de serem toleradas, ou de ficarem restritas ao campo da indignação, estão se tornando tipos penais na ordem jurídica de vários países.
Na Hungria: “distorcer ou publicar “informações falsas” pode gerar condenação de até 5 anos de prisão. Na Malásia, quem espalhar “fake news” pode pegar até um ano de cadeia e uma multa de até US$ 11.400 (cerca de R$ 62.600).
No Brasil, as fake news estão sendo combatidas também, principalmente, pelo potencial de seus efeitos nas disputas eleitorais, além da epidemia de casos de calúnia e difamação, linchamento virtual, dentre outras espécies. Não bastasse isso, mesmo agora, num momento tão crítico da humanidade, há pessoas criando conteúdo malicioso para causar pânico na população, desinformar, indicando tratamentos e medicamentos sem eficácia e até mesmo prejudiciais à saúde, para construir narrativas de ganho político, em meio à Pandemia da Sars-Cov-2.
O alcance e os efeitos nocivos dessa prática são imensuráveis. Desde a condenação antecipada e sem julgamento de pessoas pelo público, até ameaças públicas, exposição a situações vexatórias, constrangedoras, estelionato virtual, formação de associações criminosas, que ameaçam a estabilidade democrática do país. Essas informações podem induzir pessoas a se automedicarem, a adotarem atitudes extremas, pode influenciar eleições e uma infinidade de consequências imprevisíveis.
Combater essa prática tornou-se um grande desafio, principalmente, por que muitas vezes, em suas defesas, alguns investigados lançam mão de um discurso falido de liberdade de expressão, como se não houvesse limites ou qualquer controle sobre a responsabilidade de quem produz informações ou de quem as propaga.
Não há liberdade absoluta e a sociedade está cansada de buscar o combate num campo de batalha tão desleal como a internet, que é vista por muitos criminosos e irresponsáveis como Terra Sem Lei. Embora a tecnologia judiciária tenha avanços significativos que torna possível identificar, rastrear e aplicar a Lei contra quem comete ato ilícito nas redes sociais, diante do grande volume e da quantidade de meios distintos onde as notícias falsas e desinformações, ou discursos de ódio e ofensas aos direitos humanos são publicadas, é quase impossível ter o controle integral dessa prática.
O desafio, então, passou a ser como fazer a sociedade participar do combate e do enfrentamento dessa epidemia?
É uma guerra! Guerras são travadas em muitos fronts e uma das táticas mais eficazes para dissuadir os exércitos inimigos é tirar-lhes as fontes de suprimento e de financiamento. É essa a tática que governos estaduais estão adotando, ante a morosidade de medidas legislativas no plano Federal que endureçam as regras e as formas de controle e combate à essa prática.
Então a proposta desta Lei é declarar a ausência do interesse público em manter relações com pessoa física ou jurídica que direta ou indiretamente mantenham relação com produtores ou propagadores desse tipo de conteúdo.
A ideia é a de fazer cada cidadão pernambucano um soldado aliado para combater essa prática. A partir do momento em que as autoridades tomarem conhecimento o que pode acontecer de forma muito simples, por exemplo, marcando um órgão público numa postagem no perfil de uma rede social.
Nesta proposta, houve uma preocupação clara em preservar a atividade dos veículos sérios de imprensa além de jornalistas, blogueiros, youtubers, que não poderão ser penalizados enquanto estiverem exercendo, com responsabilidade, suas atividades profissionais.
Por isso foi proposta a distinção entre desinformação, notícia falsa e ofensa aos direitos humanos.
A mais tênue entre elas, no entanto, é a desinformação versus Notícia Falsa. Acontece que mesmo os jornalistas mais credenciados podem cometer erros e acabarem desinformando, ou até noticiando como verdadeira, notícia que, posteriormente, se revele falsa. Não são os jornalistas, youtubers, blogueiros, etc, os alvos das medidas propostas.
Até por que não há qualquer proveito para esses profissionais ou para os editoriais jornalísticos fazê-lo, ao contrário, gera um constrangimento enorme e um prejuízo à sua credibilidade capaz de arruinar sua carreira, em alguns casos, ou até mesmo de levar uma empresa a ter muitos revezes financeiros.
É certo ainda que há vários tipos de noticias que podem ser consideradas como falsas, a considerar:
1. Sátira ou paródia ("sem intenção de fazer mal, mas tem potencial para enganar")
2. Falsa conexão ("quando as manchetes, visuais das legendas não dão suporte a conteúdo")
3. Conteúdo enganoso ("má utilização da informação para moldar um problema ou de um indivíduo")
4. Contexto falso ("quando o verdadeiro conteúdo é compartilhado com informações falsas contextuais")
5. Conteúdo impostor ("quando fontes verdadeiras são forjadas" com conteúdo falso)
6. Conteúdo manipulado ("quando informação genuína ou imagens são manipuladas para enganar", como fotos "adulteradas")
7. Conteúdo fabricado ("conteúdo novo é 100% falso, projetado para enganar e fazer mal")
Nesse sentido, não se pode considerar todas essas matizes dentro de um única e inflexível paleta, já que há elementos objetivos e subjetivos a considerar. Quanto aos elementos objetivos o projeto consagra as vantagens econômica, social, pessoal, política ou eleitoral.
Já os subjetivos repousam na intenção e no potencial de induzir alguém ao erro ou a induzir comportamentos antidemocráticos, violentos, lesivos, perigosos ou que atentem contra os direitos humanos.
Quanto a liberdade de expressão, a ideia é demonstrar que não se trata de qualquer cerceamento à tal garantia, consagrada como um dos direitos fundamentais humanos. Há um limite muito sensível entre liberdade de expressão e o objeto dessa proposta.
Apesar de não haver, ainda, um consenso conceitual em âmbito nacional, a delimitação que o projeto apresenta, consegue afastar a cognição hermenêutica de ataque às liberdades individuais, além de guardar conformidade com a liberdade de imprensa.
A Constituição Federal de 1988, no inciso IV, do art. 5º afirma que é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato. Note-se que esse dispositivo apenas reforça o sentido de liberdade de expressão, que não comporta ataques anônimos, desmedidos e irresponsáveis através da liberdade de expor ideias, opiniões e pensamentos.
Portanto, fica afastada a hipótese de censura ou de cerceamento a liberdade de expressão nesse projeto de lei, uma vez que seu conteúdo não impõe qualquer medida impeditiva à publicação ou compartilhamento de conteúdo, apenas declara não haver interesse público em manter relações institucionais de qualquer espécie com quem busca auferir vantagens às custas da desinformação, da construção ou propagação de notícias falsas ou ainda de conteúdos violadores de direitos humanos.
Censura implicaria ou limitação antecipada do direito de livre expressão ou ainda uma medida repressiva que visasse a retirada do conteúdo dos meios em que foi publicado, o que não é o caso dessa proposta.
Em verdade, o projeto apenas instrumentaliza mecanismos de responsabilização por ofensas ao interesse público que o Estado tutela por dever constitucional, deixando claro que são incompatíveis com os seus princípios jurídicos fundamentais de administração pública a manutenção de relação institucional, inclusive com emprego de verba pública, com parceiros que promovam atos de natureza antidemocráticas, discriminatórias e com total desprezo pela sociedade como os que este projeto visa consagrar em Lei.
O dever de informar, que o projeto menciona, não implica imposição de obrigação por parte do Legislativo aos Poderes Públicos, já que esse dever já é inerente à administração pública enquanto princípio, portanto, já é uma obrigação do Estado. O projeto apenas reforça esse entendimento para deixar claro, tanto para administradores quanto para administrados a repercussão e o alcance dos efeitos de seu conteúdo.
Quanto a ausência de Interesse público em ter relações com o perfil de pessoa física e jurídica de que trata o projeto é, de per si fato impeditivo para a celebração de contratos públicos.
Não há, por fim, digressões possíveis, nem há falar em incursão em qualquer desvirtuamento das competências legislativas, já que, nesse mister o projeto apenas declara o óbvio, isto é, que pessoas físicas ou jurídicas que produzam, patrocinem ou espalhem notícias falsas, desinformação e ofensas aos direitos humanos, nos termos limitados a que se referem seus estatutos, encontram-se em conflito direto com o princípio da boa-fé, o que as impede de celebrar atos e contratos com o Estado, por razão inquestionável de ética, moralidade, ausência de interesse público e de legalidade.
Histórico
Isaltino Nascimento
Deputado
Informações Complementares
Status | |
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Situação do Trâmite: | AUTOGRAFO_PROMULGADO |
Localização: | SECRETARIA GERAL DA MESA DIRETORA (SEGMD) |
Tramitação | |||
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1ª Publicação: | 05/06/2020 | D.P.L.: | 9 |
1ª Inserção na O.D.: |
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