
PROJETO DE LEI ORDINÁRIA 932/2020
Institui o Estatuto da Liberdade Econômica do Estado de Pernambuco
Texto Completo
Art. 1º Esta Lei estabelece, nos termos do inciso IV do art. 1º, parágrafo único do art. 170 e do art. 174 da Constituição Federal, bem como dos artigos 1º e 139 da Constituição do Estado de Pernambuco, normas complementares de proteção à livre iniciativa e ao livre exercício de atividade econômica e disposições sobre a atuação do Estado como agente normativo e regulador, constituindo-se, em seu todo, o Estatuto da Liberdade Econômica do Estado de Pernambuco.
§ 1º Esta Lei constitui norma complementar de direito econômico, conforme disposto no §2º e inciso I do art. 24 da Constituição Federal, e não afasta a incidência de outras normas de proteção à livre iniciativa e ao livre exercício da atividade econômica, notadamente o disposto na Lei Federal nº 13.874, de 20 de setembro de 2019.
§ 2º As normas contidas nesta Lei devem ser harmonizadas com os princípios, diretrizes e garantias contidos na Lei Federal nº 13.874, de 20 de setembro de 2019, e serão observadas para todos os atos públicos de liberação da atividade econômica executados no âmbito do Estado de Pernambuco.
§ 3º Para fins do disposto nesta Lei, consideram-se atos públicos de liberação a licença, a autorização, a concessão, a inscrição, a permissão, o alvará, o cadastro, o credenciamento, o estudo, o plano, o registro e os demais atos exigidos, sob qualquer denominação, por órgão ou entidade da Administração Pública na aplicação de legislação, como condição para o exercício de atividade econômica, inclusive o início, a continuação e o fim para a instalação, a construção, a operação, a produção, o funcionamento, o uso, o exercício ou a realização, no âmbito público ou privado, de atividade, serviço, estabelecimento, profissão, instalação, operação, produto, equipamento, veículo, edificação e outros.
Art. 2º São princípios que norteiam o disposto nesta Lei:
I - a liberdade como uma garantia no exercício de atividades econômicas;
II - a boa-fé do particular perante o poder público;
III - a intervenção subsidiária e excepcional do Estado sobre o exercício de atividades econômicas; e
IV - o reconhecimento da vulnerabilidade do particular perante o Estado.
Parágrafo único. Regulamento disporá sobre os critérios de aferição para afastamento do inciso IV deste artigo, limitados a questões de má-fé, hipersuficiência ou reincidência.
Art. 3º São deveres do Estado de Pernambuco, para garantia da livre iniciativa:
I - facilitar a abertura e o encerramento de empresas, inclusive pela progressiva adoção de meios virtuais para requerimentos e procedimentos administrativos;
II - disponibilizar informações claras e amplamente acessíveis quanto aos procedimentos necessários ao início, regular exercício e encerramento de um empreendimento;
III - criar, promover e consolidar um sistema integrado de licenciamento;
IV - abster-se de exigir especificação técnica desnecessária ao atingimento do fim almejado;
V - abster-se de criar privilégio exclusivo para determinado segmento econômico, em detrimento dos demais;
VI - abster-se de criar reserva de mercado para determinado grupo econômico ou profissional, em prejuízo dos demais concorrentes;
VII - conceder tratamento isonômico para o exercício de atos de liberação da atividade econômica, hipótese em que o ato de liberação estará vinculado aos critérios de interpretação adotados em decisões administrativas análogas anteriores;
VIII - adotar, no exercício da atividade fiscalizatória, um caráter prioritariamente orientador, quando a situação ou a atividade desenvolvida, por sua natureza e grau de risco, for compatível com esse procedimento;
IX - simplificação tributária através de alíquotas uniformes, a fim de diminuir o custo operacional dos empreendedores e facilitar a fiscalização tributária; e
X - simplificação do cumprimento das obrigações tributárias acessórias.
Art. 4º São direitos dos empreendedores, no âmbito do Estado de Pernambuco:
I - ter o Estado de Pernambuco como um facilitador do desenvolvimento da atividade econômica;
II - produzir, empregar e gerar renda, assegurada a liberdade para desenvolver atividade econômica em qualquer horário ou dia da semana, inclusive feriados, sem que para isso esteja sujeita a cobranças ou encargos adicionais;
III - definir livremente, em mercados não regulados, o preço de produtos e de serviços como consequência de alterações da oferta e da demanda;
IV - receber tratamento isonômico de órgãos e de entidades da Administração Pública quanto ao exercício de atos de liberação da atividade econômica, hipótese em que o ato de liberação estará vinculado aos mesmos critérios de interpretação adotados em decisões administrativas análogas anteriores, observado o disposto em regulamento;
V - gozar de presunção de boa-fé nos atos praticados no exercício da atividade econômica;
VI - desenvolver, executar, operar ou comercializar novas modalidades de produtos e de serviços quando as normas infralegais se tornarem desatualizadas por força de desenvolvimento tecnológico consolidado nacional ou internacionalmente, nos termos estabelecidos em regulamento, que disciplinará os requisitos para aferição da situação concreta, os procedimentos, o momento e as condições dos efeitos;
VII - não ser exigida medida ou prestação compensatória ou mitigatória abusiva, em sede de estudos de impacto ou outras liberações de atividade econômica no direito;
VIII - não ser exigida pela Administração Pública estadual, direta ou indireta, certidão sem previsão expressa em lei.
Parágrafo único. No exercício dos direitos previstos neste artigo, os empreendedores deverão guardar observância à legislação aplicável de acordo com a atividade econômica exercida, notadamente:
I - às normas de proteção ao meio ambiente, incluídas as de repressão à poluição sonora e à perturbação do sossego público;
II - às normas de proteção e defesa do consumidor;
III - às restrições advindas de contrato, de regulamento condominial ou de outro negócio jurídico, bem como as decorrentes das normas de direito real, incluídas as de direito de vizinhança;
IV - à legislação trabalhista;
V - às normas atinentes à função social da propriedade; e
VI - às normas de defesa da livre concorrência.
Art. 5º Nas solicitações de atos públicos de liberação da atividade econômica sob responsabilidade da Administração Pública estadual, apresentados todos os elementos necessários à instrução do processo, o particular será cientificado, expressa e imediatamente, do prazo máximo estipulado para a análise de seu pedido e de que, transcorrido o prazo fixado, o silêncio da autoridade competente importará aprovação tácita para todos os efeitos, ressalvadas as hipóteses expressamente vedadas em lei.
§ 1º O prazo máximo para análise do pedido de licenciamento será de:
I - 30 (trinta) dias, para atividades econômicas consideradas de médio risco;
II - 60 (sessenta) dias, para atividades econômicas consideradas de alto risco, salvo disposição legal em contrário.
§ 2º Para as atividades consideradas de baixo risco, nos termos da legislação aplicável, para a qual se valha exclusivamente de propriedade privada própria ou de terceiros consensuais, ficam dispensados quaisquer atos públicos de liberação da atividade econômica, nos termos do inciso I do art. 3º da Lei Federal nº 13.874, de 20 de setembro de 2019.
§ 3º O disposto no caput deste artigo não se aplica quando:
I - versar sobre questões tributárias de qualquer espécie ou de concessão de registro de marcas;
II - a decisão importar em compromisso financeiro da Administração Pública estadual; e
III - houver objeção expressa em tratado em vigor no País ou na legislação aplicável.
§ 4º Caberá ao Poder Executivo Estadual proceder à classificação das atividades econômicas quanto ao seu grau de risco, prevalecendo, em caso de omissão, a classificação estabelecida pelo Poder Executivo Federal ou, em sua ausência, a resolução do Comitê para Gestão da Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios (CGSIM).
Art. 6º As propostas de leis e atos normativos de interesse geral de agentes econômicos ou de usuários dos serviços prestados, editadas pelo Poder Público ou por órgão ou entidade da Administração Pública estadual, incluídas as autarquias e as fundações públicas, serão precedidas da realização de análise de impacto regulatório, assim como comprovação quanto à sua estrita conformidade aos princípios da livre iniciativa e do livre exercício de atividade econômica, sendo admitida a intervenção estatal para dar conformidade aos princípios previstos no art. 170 da Constituição Federal.
§ 1º O estudo de impacto regulatório conterá informações e dados sobre os possíveis efeitos da lei ou ato normativo, de modo a possibilitar a verificação de sua razoabilidade.
§ 2º Dentre outros aspectos, o estudo de impacto regulatório de que trata o caput deste artigo deverá conter, sempre que possível:
I - estimativa do quantitativo total de pessoas, empresas e atividades econômicas abrangidas pela medida;
II - estimativa monetária do impacto econômico da medida para o particular e para o Poder Público e as medidas de compensação ou mitigatórias a serem implementadas, se houver;
III - comprovação da eficiência, eficácia e efetividade da medida proposta;
IV - análise comparativa da medida proposta em relação aos bens jurídicos contrapostos; e
V - comprovação da inexistência de meios alternativos menos gravosos para o atingimento do fim almejado.
§ 3º A intervenção no domínio econômico dar-se-á na justa medida em que necessária para assegurar o cumprimento dos princípios previstos no art. 170 da Constituição Federal.
Art. 7º Deverá ser observado o devido respeito à dignidade das pessoas jurídicas, compreendida a proteção de suas liberdades legal e constitucionalmente estabelecidas, seus valores e sua identidade perante o mercado, visando assim a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.
Art. 8º Caberá ao Poder Executivo regulamentar a presente Lei em todos os aspectos necessários à sua fiel execução.
Art. 9º Esta Lei entra em vigor após decorridos 180 (cento e oitenta) dias de sua publicação oficial.
Justificativa
A presente proposição traz normas complementares a par das existentes na Lei Federal nº 13.874, de 20 de setembro de 2019, que institui a Declaração de Direitos da Liberdade Econômica, estabelece garantias de livre mercado, e dá outras providências.
Dessa forma, a proposta ora apresentada vem simplificar os procedimentos junto à Administração Pública para a abertura e encerramento de empresas no âmbito do Estado de Pernambuco, constituindo marco fundamental em defesa da livre iniciativa e livre exercício da atividade econômica em nosso Estado.
Dentre as principais inovações, a proposição estabelece que o Estado de Pernambuco deve agir como um ente fomentador de novos negócios e empregos, por meio da (i) adoção de procedimentos administrativos simplificados, (ii) disponibilização de informações claras e amplamente acessíveis quanto aos procedimentos necessários ao início, regular exercício e encerramento de um empreendimento; (iii) criação de sistema integrado de licenciamento; (iv) abstenção quanto à exigência de especificação técnica desnecessária ou criação de reserva de mercado para determinado grupo econômico; (vi) concessão de tratamento isonômico aos agentes econômicos, dentre outras medidas.
É importante ressaltar que a presente proposta preserva as hipóteses constitucionalmente estipuladas de intervenção na ordem econômica.
Afinal, deve-se levar em conta que a Constituição Federal, ao eleger a livre iniciativa como um de seus fundamentos (art. 1º, IV), deixou assente que a República Federativa do Brasil tem orientação essencialmente capitalista. Em suma, deve ser garantido a todo indivíduo a liberdade de lançar-se ao exercício de uma atividade econômica, sem amarras por parte do Estado, visando auferir lucros.
Em contraparte, o texto constitucional relativiza a opção pela economia de mercado, deixando vários segmentos sujeitos à intervenção estatal ativa. Uma das consequências de tal diretriz é a permissão direcionada ao legislador ordinário, no sentido de poder intervir diretamente em setores da economia, desde que seja para dar conformidade a outras normas também de índole constitucional.
Nesse esteio, a livre iniciativa é repetida no art. 170, da CF, que trata da Ordem Econômica e Financeira, desta feita imbricada a diversos princípios, que funcionam como um contraponto ao modelo liberal. Dentre esses princípios estão: a soberania nacional; a propriedade privada; a função social da propriedade; a livre concorrência; a defesa do consumidor; a defesa do meio ambiente; a redução das desigualdades regionais e sociais; a busca do pleno emprego etc.
Assim, é inegável que a liberdade econômica é um traço substancial do ordenamento jurídico brasileiro, sendo, por outro lado, igualmente inegável que o legislador ordinário pode promover restrições à livre iniciativa plena, desde que o faça plasmado em algum dos princípios da Ordem Econômica acima transcritos.
Em ordem a reforçar o raciocínio supra, transcreve-se o lapidar voto do Ministro Celso Peluso, proferido no julgamento da AC 1.657:
“…livre iniciativa não é sinônimo de liberdade econômica absoluta (...). O que ocorre é que o princípio da livre iniciativa, inserido no caput do art. 170 da CF, nada mais é do que uma cláusula geral cujo conteúdo é preenchido pelos incisos do mesmo artigo. Esses princípios claramente definem a liberdade de iniciativa não como uma liberdade anárquica, porém social, e que pode, consequentemente, ser limitada.” (STF, AC 1.657-MC, voto do rel. p/ o ac. min. Cezar Peluso, julgamento em 27-6-2007, Plenário, DJ de 31-8-2007.)
A presente proposição reafirma essa possibilidade de intervenção estatal, ao determinar que os agentes econômicos, no exercício do direito à livre iniciativa, deverão guardar observância à legislação aplicável de acordo com a atividade econômica exercida, notadamente: (i) as normas de proteção ao meio ambiente, incluídas as de repressão à poluição sonora e à perturbação do sossego público; (ii) as normas de proteção e defesa do consumidor; (iii) as restrições advindas de contrato, de regulamento condominial ou de outro negócio jurídico, bem como as decorrentes das normas de direito real, incluídas as de direito de vizinhança, dentre outras.
Por outro lado, a proposta ora apresentada vem coibir eventuais excessos na atuação estatal, determinando que o estímulo e fomento às atividades econômicas devem ser a regra, inclusive por meio da adoção de prazo máximo para análise dos procedimentos de abertura de novos empreendimentos, de acordo com o grau de risco da atividade econômica, a ser determinado pelo Poder Executivo estadual, ou em sua ausência, de acordo com ato do Poder Executivo Federal ou resolução do Comitê para Gestão da Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios (CGSIM), conforme o caso.
Nesse contexto, transcorrido o prazo fixado, o silêncio da autoridade competente importará aprovação tácita para todos os efeitos, ressalvadas as hipóteses expressamente vedadas em lei, o que não impede a realização de ulterior fiscalização ou adequação da atividade econômica.
Ressalta-se, também, que a proposta, não obstante reconheça o justo lugar da intervenção estatal no exercício da atividade econômica com vistas à tutela de direitos e interesses da coletividade, determina que sejam realizados estudos de impactos regulatórios, em que restem comprovados os benefícios potencialmente estipulados.
Para tanto, o estudo de impacto regulatório, previsto de forma geral na Lei Federal nº 13.874/2019, deve ser contemplado, no âmbito do Estado de Pernambuco, com, no mínimo, os seguintes aspectos, sem prejuízo de outros fixados pelo próprio Poder Executivo estadual: (i) estimativa do quantitativo total de pessoas, empresas e atividades econômicas abrangidas pela medida; (ii) estimativa monetária do impacto econômico da medida para o particular e para o Poder Público e as medidas de compensação ou mitigatórias a serem implementadas, se houver; (iii) comprovação da eficiência, eficácia e efetividade da medida proposta; (iv) análise comparativa da medida proposta em relação aos bens jurídicos contrapostos; e (v) comprovação da inexistência de meios alternativos menos gravosos para o atingimento do fim almejado.
Quanto à constitucionalidade forma, ressalta-se que a proposição encontra-se inserta na competência concorrente da União, Estados-membros e Distrito Federal para legislar sobre direito econômico (art. 24, I, CF/88). É incontroverso que a competência da União para legislar sobre normas gerais de proteção e integração social das pessoas portadoras de deficiência não afasta a competência dos Estados-membros.
Nesse sentido, é lícito à lei estadual legislar sobre assunto da competência concorrente, desde que, no exercício de tal atividade, o Estado-membro venha a acrescentar, de maneira constitucional, legal e jurídica, disposições complementares a par das normas gerais já existentes. É a denominada competência suplementar-complementar dos Estados-membros, caso da presente proposição.
Por fim, a presente proposta constitui medida essencial para criar um ambiente favorável ao incremento da atividade empresarial em nosso Estado, readequando a burocracia estatal e, em última análise, trazendo desenvolvimento econômico, emprego e renda para a população pernambucana.
Diante do exposto, solicito o apoio de meus valorosos pares à aprovação da presente proposta.
Histórico
Erick Lessa
Deputado
Informações Complementares
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Situação do Trâmite: | AUTOGRAFO_PROMULGADO |
Localização: | SECRETARIA GERAL DA MESA DIRETORA (SEGMD) |
Tramitação | |||
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1ª Publicação: | 21/02/2020 | D.P.L.: | 12 |
1ª Inserção na O.D.: |
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Tipo | Número | Autor |
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Parecer FAVORAVEL_ALTERACAO | 5002/2021 | Constituição, Legislação e Justiça |
Parecer REDACAO_FINAL | 5428/2021 | Redação Final |
Substitutivo | 1/2021 |