
Parecer 5104/2021
Texto Completo
PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 1818/2021
AUTORIA: DEPUTADA DELEGADA GLEIDE ÂNGELO
PROPOSIÇÃO QUE DISPÕE SOBRE A COMUNICAÇÃO COMPULSÓRIA PELAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO PÚBLICAS E PRIVADAS QUANDO DA EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE GRAVIDEZ POR ALUNA COM MENOS DE 14 (QUATORZE) ANOS E 9 (NOVE) MESES DE IDADE. PROTEÇÃO À INFÂNCIA E À JUVENTUDE. MATÉRIA INSERTA NA COMPETÊNCIA LEGISLATIVA CONCORRENTE DO ART. 24, XV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA. AUSÊNCIA DE VÍCIOS DE INCONSTITUCIONALIDADE, ILEGALIDADE OU ANTIJURIDICIDADE. PELA APROVAÇÃO.
1. RELATÓRIO
É submetido à apreciação desta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, para análise e emissão de parecer, o Projeto de Lei Ordinária nº 1818/2021, de autoria da Deputada Delegada Gleide Ângelo, que se dirige às instituições de ensino, públicas e privadas, que deverão comunicar a existência de indícios de gravidez de aluna com menos de 14 (quatorze) anos e 9 (nove) meses de idade.
O projeto de lei em referência tramita nesta Assembleia Legislativa pelo regime ordinário, conforme inciso III do art. 223 do Regimento Interno.
É o Relatório.
2. PARECER DO RELATOR
Nos termos do art. 94, inciso I, do Regimento Interno desta Assembleia Legislativa, compete à Comissão de Constituição, Legislação e Justiça manifestar-se sobre a constitucionalidade, legalidade e juridicidade das matérias submetidas à sua apreciação.
O projeto vem arrimado no art. 19, caput, da Constituição Estadual e no art. 194, inciso I, do Regimento Interno desta Assembleia Legislativa, não constando no rol de matérias cuja iniciativa é reservada privativamente ao Governador do Estado.
Sob o prisma da competência formal orgânica, a proposição em cotejo versa sobre assunto inserido na competência legislativa concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal para dispor sobre proteção à infância e à juventude, nos termos do art. 24, inciso XV, da Lei Maior, in verbis:
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
[...]
XV - proteção à infância e à juventude;
Outrossim, revela-se compatível com o princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, inciso III, da Constituição Federal – CF/88) e com os princípios constitucionalmente estabelecidos que asseguram à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à dignidade, ao respeito, e à liberdade, senão vejamos:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
[...]
§ 4º A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente.
A prioridade de proteção e amparo de que gozam as crianças e os adolescentes é reafirmada, também, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, Lei Federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990, nos seguintes termos:
Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:
a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;
b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;
c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;
d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.
Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.
Art. 6º Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.
Art. 7º A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência.
[...]
Ademais, o dever de comunicação às autoridades competentes de certos fatos juridicamente relevantes, como se afigura nos casos em apreço, é prática igualmente contemplada no ECA:
Art. 13. Os casos de suspeita ou confirmação de castigo físico, de tratamento cruel ou degradante e de maus-tratos contra criança ou adolescente serão obrigatoriamente comunicados ao Conselho Tutelar da respectiva localidade, sem prejuízo de outras providências legais. (Redação dada pela Lei nº 13.010, de 2014)
[...]
Art. 245. Deixar o médico, professor ou responsável por estabelecimento de atenção à saúde e de ensino fundamental, pré-escola ou creche, de comunicar à autoridade competente os casos de que tenha conhecimento, envolvendo suspeita ou confirmação de maus-tratos contra criança ou adolescente:
Pena - multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência.
O dever de informação ao Poder Público em determinadas circunstâncias é tão imprescindível que sua omissão pode ensejar, inclusive, contravenção penal, referente à Administração Pública, como previsto no art. 66 da Lei de Contravenções Penais – LCP, Decreto-Lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941:
Art. 66. Deixar de comunicar à autoridade competente:
I – crime de ação pública, de que teve conhecimento no exercício de função pública, desde que a ação penal não dependa de representação;
II – crime de ação pública, de que teve conhecimento no exercício da medicina ou de outra profissão sanitária, desde que a ação penal não dependa de representação e a comunicação não exponha o cliente a procedimento criminal:
Pena – multa, de trezentos mil réis a três contos de réis.
Assim, segundo preconiza a LCP, quando verificados indícios de prática de estupro contra pessoa menor de 14 (catorze) anos, cuja natureza da ação penal é pública incondicionada – como a suspeita ou a gravidez confirmada de criança ou adolescente abaixo dessa idade –, aquele que tomar conhecimento no exercício de função pública, da medicina ou de outra profissão sanitária já é legalmente obrigado a comunicar à autoridade competente.
Por certo, o projeto em estudo segue a mesma lógica, e pretende assegurar a efetiva proteção das crianças e dos adolescentes por meio da imposição do dever de cuidado, vigilância e comunicação daqueles que têm condições reais de perceber com clareza e, até exatidão, a ocorrência desses crimes. Logo, tem o potencial de prevenir a impunidade, a persistência da prática da conduta delituosa e a subnotificação proveniente da omissão ou inércia sociais.
Ademais, essa Comissão já se mostrou favorável a iniciativas desse viés, como por exemplo na apreciação técnica do Projeto de Lei nº 794/2012, de que proveio a Lei nº 14.633, de 23 de abril de 2012 (Dispõe sobre o procedimento de notificação compulsória dos casos de violência contra mulher, criança, adolescente, idoso e pessoa com deficiência atendidos em estabelecimentos e serviços de saúde públicos e privados do Estado de Pernambuco).
Feitas as considerações pertinentes, ausentes vícios de inconstitucionalidade, ilegalidade ou antijuridicidade, o parecer do Relator é pela aprovação do Projeto de Lei Ordinária nº 1818/2021 de autoria da Deputada Delegada Gleide Ângelo.
É o Parecer do Relator.
3. CONCLUSÃO DA COMISSÃO
Diante do exposto, tendo em vista as considerações expendidas pelo Relator, a CCLJ, por seus membros infra-assinados, opina pela aprovação do Projeto de Lei Ordinária nº 1818/2021, de autoria da Deputada Delegada Gleide Ângelo.
Histórico