Indicação No 4942/2023
Texto Completo
Indicamos à Mesa, ouvido o Plenário e cumpridas as formalidades regimentais, que seja encaminhado apelo à Exma. Sra. Governadora do Estado de Pernambuco, Raquel Teixeira Lyra Lucena, para que inclua as costureiras do Polo de Confecções do Agreste no Programa Chapéu de Palha.
Justificativa
A presente Indicação tem como objetivo fortalecer as condições e a qualidade de vida das costureiras do Polo de Confecções do Agreste, solicitando que a Governadora Raquel Lyra as inclua no Programa Chapéu de Palha.
No Agreste de Pernambuco, em meados do século XX, deu-se o surgimento da produção de peças de vestuário para revendas em feiras locais, popularmente conhecidas como “sulancas”[1]. No decorrer dos anos, a indústria de confecções na região se expandiu bastante, transformando-se naquilo que é chamado de Arranjo Produtivo Local (APL)[2]. Atualmente, essa indústria desempenha um papel significativo como o segundo maior produtor nacional de confecções[3]. No entanto, é importante observar que a força de trabalho que impulsiona este setor é composta principalmente por mulheres, trabalhadoras informais e que se organizam em pequenas entidades conhecidas como facções.
Sabe-se que o trabalho se constitui como um elemento essencial na construção do ser social[4], pois ele desempenha a função de intermediar as relações dos seres humanos com a natureza. O trabalho é importante tanto da perspectiva da produção de meios diretos de subsistência, quanto da perspectiva da criação de meios de produção[5]. Apesar do crescimento econômico e do patamar de segundo maior produtor nacional de confecções, o trabalho realizado por estas mulheres não se reflete em ganhos para si próprias. Ao contrário, a desigualdade social nas cidades que compõem o referido Polo é evidenciada pelas condições precárias de vida e do próprio trabalho que suas e seus residentes enfrentam. Tais elementos são consequências diretas da precarização do trabalho e dos processos de flexibilização de acúmulo de capital[6].
As costureiras do Polo de Confecções do Agreste têm acesso a uma fração ínfima das riquezas que produzem, pois precisam enfrentar extensas jornadas de trabalho, um volume de produção muito intenso, remuneração de sua força de trabalho abaixo do valor, ausência de direitos trabalhistas, entre outros fatores críticos.
Todos esses elementos são ainda mais intensificados por uma das características mais marcantes deste APL específico, qual seja, a perspectiva de gênero. Além de lidar com a precarização e a exploração do seu trabalho produtivo, estas mulheres precisam executar, ainda, as tarefas domésticas e de cuidado.
Essa divisão de gênero não é apenas uma coincidência, mas uma característica intrínseca do sistema, onde as mulheres são empurradas para condições de trabalho completamente desfavoráveis e adversas, ao passo em que os donos das grandes confecções, em sua maioria homens, seguem acumulando vultosos lucros. A flexibilização e a precarização do trabalho atingem de forma desproporcional as costureiras, que via de regra são forçadas a aceitar essas condições de exploração em busca de sustento para suas famílias.
Conforme pontua Silvia Federici[7], nestes casos em que as mulheres precisam conciliar jornadas domésticas e de trabalho produtivo, a remuneração pelo trabalho desconsidera duas dimensões. A um lado, oculta o trabalho não pago destinado ao lucro das grandes confecções e, a outro, o trabalho doméstico não-assalariado. Por conta disso, todos os aspectos da vida destas mulheres operam em função da acumulação de capital alheia.
Em outras palavras, as mesmas costureiras que montam e trabalham em facções para sustentar suas famílias, também precisam executar os trabalhos de cuidar destas mesmas famílias, as quais, no futuro próximo, comporão a mão de obra a ser explorada pelas grandes confecções.
O processo de atribuição de valor na produção de confecções do Agreste é permeado por relações sociais de trabalho complexas, marcadas pela informalidade, pela flexibilidade, pela precariedade e apresentadas sob a narrativa do “empreendedorismo”. Além disso tudo, por serem consideradas como “empreendedoras”, necessitam arcar com os aviamentos, a energia elétrica, a manutenção das máquinas, etc.
Considere-se ainda que o adoecimento e o envelhecimento precoce das costureiras é agravado pela exploração excessiva da força de trabalho. A intensificação das cargas de trabalho e a falta de medidas de proteção social resultam em um ambiente desprotegido, que prejudica a saúde e o bem-estar dessas mulheres. Essa exploração, portanto, se manifesta não apenas no aumento das cargas de trabalho, mas também na deterioração das condições de vida dessas mulheres trabalhadoras.
Por fim, além de todas estas adversidades, estas mulheres também enfrentam grandes intervalos entre os picos de produtividade, metaforicamente equivalentes às “entre-safras”. Ao longo do ano, em momentos próximos a festividades e datas comemorativas, a demanda pelos serviços das costureiras aumenta. Passados tais períodos, a procura diminui drasticamente, contribuindo para a vulnerabilização destas mulheres e suas famílias, bem como, para a precarização ainda maior dos preços praticados.
Ante todo o exposto, considerando a relevância do ofício desempenhado pelas costureiras do Polo de Confecções do Agreste, suas condições de vulnerabilidade social e de precariedade no trabalho, solicitamos aos Ilustres Pares a aprovação da presente Indicação.
REFERÊNCIAS
[1] MILANÊS, Renata. O trabalho das mulheres costureiras na zona rural do Agreste pernambucano. Revista IDeAS, Rio de Janeiro, volume 14, 1-29, jan./dez. 2020
[2] Governo Federal. APL. Disponível em: https://www.gov.br/produtividade-e-comercio-exterior/pt-br/assuntos/competitividade-industrial/arranjos-produtivos-locais-apl#:~:text=Arranjos%20Produtivos%20Locais%20(APLs)%20s%C3%A3o,locais%2C%20tais%20como%3A%20governo%2C. Acesso em: 01 nov. 2013.
[3] ZANINI, Fábio. No agreste, polo de confecções serve de laboratório para reforma de Guedes, 2019. Disponível em: . Acesso em: 10 maio 2019.
[4] LUKÁCS , György . Para uma ontologia do ser social II . São Paulo: Boitempo , 2013 .
[5] MARX , Karl . O capital: livro I. São Paulo: Boitempo , 2013 .
[6] HARVEY, David. A condição pós-moderna. São Paulo: Loyola, 1995.
[7] FEDERICI, Silvia. O Ponto Zero da Revolução. Trad. Coletivo Sycorax. Editora Elefante, 2019.
Histórico
Dani Portela
Deputada
Informações Complementares
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Situação do Trâmite: | ENVIADO_PARA_COMUNICACAO |
Localização: | SECRETARIA GERAL DA MESA DIRETORA (SEGMD) |
Tramitação | |||
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1ª Publicação: | 12/12/2023 | D.P.L.: | 11 |
1ª Inserção na O.D.: |