Parecer 485/2023
Texto Completo
PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO Nº 3/2023
AUTORIA: DEPUTADA SIMONE SANTANA E OUTROS
PROPOSIÇÃO QUE ACRESCE O ART. 137-A À CONSTITUIÇÃO ESTADUAL. ORÇAMENTO DA CRIANÇA. MECANISMO DE CONTROLE ORÇAMENTÁRIO. DIREITO FINANCEIRO. COMPETÊNCIA CONCORRENTE. FINANÇAS PÚBLICAS. NORMAS GERAIS. UNIÃO. LRF. NÃO COLISÃO. TRANSPARÊNCIA. FORTALECIMENTO. ATUAÇÃO LEGISLATIVA DO ESTADO POSSÍVEL. INEXISTÊNCIA DE VÍCIOS DE INCONSTITUCIONALIDADE OU ILEGALIDADE. PELA APROVAÇÃO.
1. RELATÓRIO
É submetido a esta Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, para análise e emissão de parecer, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 3/2023, de autoria da Deputada Simone Santana, que acresce o art. 137-A à Constituição do Estado de Pernambuco, a fim de instituir o chamado Orçamento da Criança.
Na justificativa, a autora da proposição destaca que a medida atende a um conjunto de exigências indispensáveis para possibilitar a identificação de ações e programas orçamentários voltados ao atendimento à primeira infância, representando um importante passo para permitir que se calcule adequadamente qual parcela do orçamento público estadual é efetivamente destinado às crianças.
A Proposta em referência tramita nesta Assembleia Legislativa pelo regime ordinário (Art. 253, III, Regimento Interno).
É o relatório.
2. PARECER DO RELATOR
A proposição vem arrimada no Art. 17, I, da Constituição Estadual e no Art. 210, I, do Regimento Interno desta Assembleia Legislativa.
Inicialmente é importante esclarecermos sobre qual matéria dispõe a proposta em testilha. Nessa perspectiva, entendemos que estamos diante de uma disposição sobre direito financeiro, que visa fortalecer o controle e a transparência na gestão pública.
Direito Financeiro, para Ricardo Lobo Torres, é um conjunto de normas e princípios que regulam a atividade financeira, incumbindo-lhe disciplinar a constituição e a gestão da Fazenda Pública, estabelecendo regras e procedimentos para a obtenção de receita e a realização dos gastos necessários à consecução dos objetivos do Estado. (TORRES, Ricardo Lobo. Direito financeiro e tributário. Rio de Janeiro: Renovar, 1998, p.12).
Percebe-se, portanto, que o cerne do Direito Financeiro é a atividade financeira do Estado, a qual certamente abrange a aplicação dos recursos públicos, bem como o controle e a fiscalização desta, a fim de se aferir a adequação ao interesse público. Nessa senda, Geraldo Ataliba destaca que “são partes, pois, do Direito Financeiro o Direito Tributário e as disciplinas Jurídicas do orçamento, fiscalização e controle orçamentário, da contabilidade pública e do crédito publico.” (ATALIBA, Geraldo. Normas gerais de direito financeiro e tributário e a autonomia dos estados e municípios. In: Revista de Direito Público, São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 10, p.52)
Ora, observamos que o intento legislativo da alteração constitucional em análise é o fortalecimento do controle e da fiscalização – elementos importantes do direito financeiro – sobre a destinação e execução de recursos destinados à primeira infância.
O chamado “Orçamento da Criança” vem na esteira do Marco Legal da Primeira Infância, instituído pela Lei nº 13.257, de 8 de março de 2016, que prevê o seguinte:
Art. 11. As políticas públicas terão, necessariamente, componentes de monitoramento e coleta sistemática de dados, avaliação periódica dos elementos que constituem a oferta dos serviços à criança e divulgação dos seus resultados.
[...]
§ 2º A União informará à sociedade a soma dos recursos aplicados anualmente no conjunto dos programas e serviços para a primeira infância e o percentual que os valores representam em relação ao respectivo orçamento realizado, bem como colherá informações sobre os valores aplicados pelos demais entes da Federação.
Deste modo, a garantia de transparência orçamentária relativa aos gastos com as crianças passará a ter status constitucional no âmbito do Estado de Pernambuco.
Assim, uma vez demonstrado que a PEC nº 3/2023 dispõe sobre Direito Financeiro, podemos afirmar que não há vícios de inconstitucionalidade formal ou material, pois os Estados, o Distrito Federal e a União podem, concorrentemente, legislar sobre essa matéria, nos termos do inciso I do art. 24 da Constituição Federal, bem como a matéria não está reservada à iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo (art. 61, § 1º, CF/88 c/c art. 19, § 1º, Constituição Estadual) e, por fim, não há incompatibilidade do objeto da proposição com a Constituição.
Merece registro – embora já seja do conhecimento de todos os membros desta Comissão – que no âmbito do condomínio legislativo (competência legislativa concorrente, como é o caso do direito financeiro) compete à União estabelecer normas gerais, as quais não excluem a competência suplementar dos Estados (§§ 1º e 2º do art. 24, da CF/88), ou seja, respeitadas as normas gerais da União, os Estados e o Distrito Federal podem estabelecer normas específicas sobre o direito financeiro, a fim de atender suas particularidades.
No uso de sua competência para legislar sobre normas gerais, a União produziu a LRF – Lei de Responsabilidade Fiscal –, Lei Complementar nº 101, de 2000, que estabelece normas de finanças públicas (questão inerente ao direito financeiro), a fim de dar cumprimento ao art. 163 da Constituição Federal.
Ao cotejarmos a PEC nº 3/2023 e a LRF não visualizamos contrariedade daquela a esta. Na verdade, percebemos plena consonância entre a inovação proposta e os mecanismos de transparência previstos na LRF. Nesse sentido, vejamos a transcrição dos seguintes dispositivos da Lei Complementar nº 101, de 2000:
Art. 48. São instrumentos de transparência da gestão fiscal, aos quais será dada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público: os planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de contas e o respectivo parecer prévio; o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão Fiscal; e as versões simplificadas desses documentos.
§ 1º A transparência será assegurada também mediante:
[...]
II - liberação ao pleno conhecimento e acompanhamento da sociedade, em tempo real, de informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira, em meios eletrônicos de acesso público;
Outrossim, ainda que se alegue que o conteúdo do Relatório Resumido da Execução Orçamentária (RREO) está previsto na LRF (arts. 52/53), não depreendemos que isso seja um óbice para a aprovação da PEC nº 3/2023. Ao prever a inclusão de novo elemento (manifestação específica sobre os recursos destinados ao desenvolvimento de ações e programas de atenção à primeira infância) no RREO, a PEC não contraria a norma geral (LRF).
Portanto, repisamos que a Proposta de Emenda à Constituição nº 3/2023, ao fortalecer os mecanismos de controle e transparência sobre as finanças públicas (elemento do direito financeiro), em nada desborda das disposições constitucionais e dos contornos estabelecidos pelas normas gerais emanadas da União, muito pelo contrário, ela permitirá que os cidadãos, de forma facilitada, acompanhem a efetiva execução dos créditos destinados às ações da primeira instância.
Diante do exposto, opinamos pela aprovação da Proposta de Emenda à Constituição nº 3/2023, de autoria da Deputada Simone Santana.
É o Parecer do Relator.
3. CONCLUSÃO DA COMISSÃO
Ante o exposto, tendo em vista as considerações expendidas pelo relator, a Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, por seus membros infra-assinados, opina pela aprovação da Proposta de Emenda à Constituição nº 3/2023, de autoria da Deputada Simone Santana.
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