
PROJETO DE LEI ORDINÁRIA 474/2023
Institui a Política Estadual de Fornecimento Gratuito de Medicamentos Formulados à Base de Canabidiol, nas unidades de saúde públicas estadual e privadas, conveniadas ao Sistema Único de Saúde - SUS, no Estado de Pernambuco.
Texto Completo
Art. 1º Fica instituído a Política Estadual de Fornecimento Gratuito de Medicamentos Formulados à Base de Canabidiol, em associação com outras substâncias canabidioides, incluindo o tetrahidrocanabidiol, em caráter de excepcionalidade pelo Poder Executivo, nas unidades de saúde pública estadual e privada conveniada ao Sistema Único de Saúde - SUS.
Art. 2º A política instituída tem como objetivos:
I - diagnosticar e tratar pacientes cujo tratamento com a cannabis medicinal possua eficácia ou produção científica que incentive o tratamento; e
II - fomentar o debate e fornecer informações a respeito do uso medicinal da cannabis por meio de palestras, fóruns, simpósios, cursos de capacitação, realizando parcerias público-privadas com entidades, de preferência, sem fins lucrativos.
Art. 3º Fica assegurado, ao paciente em tratamento, em caráter de excepcionalidade, o direito de receber o medicamento gratuitamente nas unidades de saúde pública estadual:
I - o medicamento poderá ser de procedência nacional ou estrangeira;
II - o medicamento deverá estar de acordo com as normas estabelecidas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA; e
III - o medicamento só deverá ser liberado mediante retenção da prescrição de profissional de saúde, legalmente habilitado para tratamento de saúde e do laudo contendo as razões da prescrição.
§ 1º O medicamento a ser fornecido deverá:
I - ser constituído de derivado vegetal;
II - ser produzido e distribuído por estabelecimentos devidamente regularizados pelas autoridades competentes em seus países de origem para as atividades de produção, distribuição ou comercialização;
III - conter certificado de análise, com especificação e teor de canabidiol e tetrahidrocanabidiol, que atenda às exigências das autoridades regulatórias em seus países de origem e no território nacional pela ANVISA;
IV - a obrigação prevista no caput deste artigo estende-se às unidades de saúde privadas conveniadas ao Sistema Único de Saúde - SUS.
§ 2º O fornecimento que trata o caput deste artigo somente será permitido mediante o cumprimento de todos os requisitos estabelecidos nesta Lei, e desde que o paciente comprovadamente não possua condições financeiras de adquirir os medicamentos nem de tê-los adquiridos pelo respectivo grupo familiar e/ou responsáveis legais, sem prejuízo do respectivo sustento.
Art. 4º A política instituída será responsabilidade da Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco, que definirá as competências em cada nível de atuação.
§ 1º A Secretaria Estadual de Saúde deverá criar comissão de trabalho para implantar as diretrizes desta política no Estado de Pernambuco.
§ 2º A Secretaria Estadual de Saúde verificará se o medicamento se enquadra nos requisitos definidos nesta Lei e nas normas da ANVISA, antes de sua aquisição e distribuição.
Art. 5º Somente será fornecido medicamente à base de canabidiol com concentração máxima de tetrahidrocanabidiol autorizado pela ANVISA.
Art. 6º Para a obtenção dos medicamentos à base de canabidiol, em associação com outras substâncias canabidioides, os pacientes devem estar cadastrados perante a Secretária Estadual de Saúde.
§ 1º O cadastramento deverá ser feito pelo paciente e/ou, caso aplicável, do responsável legal.
§ 2º O paciente receberá os medicamentos de que trata o caput deste artigo durante o período prescrito pelo médico, independentemente de idade ou sexo.
§ 3º O cadastro mencionado no caput poderá ser realizado por um dos seguintes meios:
I - cadastro eletrônico, a ser disponibilizado no sítio eletrônico da Secretária Estadual de Saúde;
II - envio do formulário e documentação exigida para o correio eletrônico institucional indicado no sítio eletrônico da Secretária de Estado da Saúde; ou
III - entrega do formulário e da documentação exigida por envio postal ou presencialmente na em locais definidos pela da Secretária Estadual de Saúde.
§ 4º A aprovação do cadastro dependerá da avaliação da Secretária Estadual de Saúde e será comunicada ao paciente ou responsável legal por meio de documento oficial.
§ 5º Para o cadastramento será necessário apresentar:
I - laudo de profissional legalmente habilitado contendo a descrição do caso, Classificação Internacional de Doenças - CID, justificativa para a utilização de medicamento não registrado no Brasil em comparação com as alternativas terapêuticas já existentes registradas pela ANVISA, bem como os tratamentos anteriores;
II - prescrição do medicamento por profissional legalmente habilitado contendo obrigatoriamente:
a) nome do paciente;
b) nome do medicamento;
c) posologias do medicamento;
d) quantidade necessária;
e) duração do tratamento;
f) data;
g) assinatura; e
h) número inscrição do profissional em seu conselho de classe.
III - Declaração de Responsabilidade e Esclarecimento para a utilização excepcional do medicamento.
§ 6º O cadastro será válido por 1 (um) ano.
I - a renovação do cadastro deverá ser realizada mediante a apresentação de novo laudo de profissional legalmente habilitado contendo a evolução do caso após o uso de medicamento de derivado vegetal à base de canabidiol, e, nova prescrição contendo obrigatoriamente as informações elencadas nas alíneas de "a" a "h" do inciso II do § 5º.
II - se houver alteração de quaisquer dos dados informados no Formulário para Importação e Uso de Medicamento à Base de canabidiol constantes no cadastro vigente devem ser apresentados no ato da renovação.
III - caso haja alteração de quaisquer dados da prescrição inicial do medicamento durante a validade do cadastro e/ou do quantitativo autorizado de medicamento de derivado vegetal à base de canabidiol, o interessado deverá enviar nova prescrição e solicitar a alteração necessária.
Art. 7º O Estado poderá celebrar convênios ou instrumentos congêneres com associações de pacientes, instituições de pesquisas e universidades públicas e privadas para cumprir o disposto nesta Lei.
Art. 8º Esta Lei entra em vigor após decorridos 90 (noventa) dias de sua publicação.
Justificativa
A temática do uso medicinal e terapêutico da cannabis a cada dia ganha mais destaque na agenda nacional e internacional. Atualmente tramitam conjuntamente no Congresso Nacional os Projetos de lei n° 4.776/2019; 5.158/2019 e 89/2023 que tratam sobre o tema. Ainda, a ANVISA publicou em 11/12/2019 resolução que passa a disciplinar o uso medicinal da cannabis.
Mas, antes de tudo, vale destacar:
A planta, popularmente conhecida como "maconha", e cientificamente chamada de Cannabis Sativa, é uma planta milenar, utilizada pela humanidade há mais de 5.000 anos, sendo conhecida por suas propriedades medicinais, entre outras.
Em 1930, iniciou-se nos Estados Unidos uma política proibicionista da Cannabis que posteriormente espalhou-se por todo o mundo. Pesquisas científicas foram suspensas e produtos antes comercializados livremente nas farmácias foram proibidos.
Mais recentemente, diversos estudos passaram a comprovar a eficácia do CBD (canabidiol) c do 'THC (tetrahidrocanabinol) para o controle das crises de epilepsia, Síndrome de Dravet, tratamentos quimioterápicos de câncer, esclerose múltipla, fibromialgia, dores crônicas, entre outros casos.
Atualmente, no Brasil, a Anvisa concede autorização para o tratamento com o canabidiol, porém há várias restrições e, mesmo com a autorização, muitos pacientes têm o acesso inviabilizado devido à burocracia para liberação em diversos órgãos.
Ocorre que o direito à saúde foi elevado ao status de direitos humanos, na Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, no artigo XXV, que define que todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar-lhe e a sua família, saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis. Ou seja, o direito à saúde é indissociável do direito à vida, que tem por inspiração o valor de igualdade entre as pessoas.
E nesse contexto, a Constituição Federal de 1988, dispõe em seu artigo 196 que "A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação"
Países como Israel, e grande parte dos Estados dos EUA, Alemanha, Espanha, Grécia, Austrália, Chile, Argentina e Uruguai já regulamentaram o uso da Cannabis Medicinal, melhorando a qualidade de vida dos pacientes e de seus familiares.
A regulação prevista neste projeto de lei é plenamente cabível no nível de normatização Estadual. A Constituição Federal prevê matérias que carecem de regulamentação legislativa, instituindo também a competência para tratar delas. No tocante ao tema da saúde, a competência legislativa cabe à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, concorrentemente. Assim já se posicionou o STF:
EMENTA: LEI DISTRITAL. NOTIFICAÇÃO MENSAL À SECRETARIA DE SAÚDE. CASOS DE CÂNCER DE PELE. OBRIGAÇÃO IMPOSTA A MÉDICOS PÚBLICOS E PARTICULARES. ADMISSIBILIDADE. SAÚDE PÚBLICA. MATÉRIA INSERIDA NO ÂMBITO DE COMPETÊNCIA COMUM E CONCORRENTE DO DISTRITO FEDERAL. ARTS. 23, I, e 24, XII, DA CF. RESPONSABILIDADE CIVIL DOS PROFISSIONAIS DA SAÚDE. MATÉRIA DE COMPETÊNCIA EXCLUSIVA DA UNIÃO. ART. 22, I. PROCEDÊNCIA PARCIAL DA AÇÃO.
I - Dispositivo de lei distrital que obriga os médicos públicos e particulares do Distrito Federal a notificarem a Secretaria de Saúde sobre os casos de câncer de pele não é inconstitucional.
II - Matéria inserida no âmbito da competência da União, Estados e Distrito Federal, nos termos do art. 23, I, da Constituição Federal.
III - Exigência que encontra abrigo também no art. 24, XII, da Carta Magna, que atribui competência concorrente aos referidos entes federativos para legislar sobre a defesa da saúde.
IV - Dispositivo da lei distrital que imputa responsabilidade civil ao médico por falta de notificação caracteriza ofensa ao art. 22, I, da CF, que consigna ser competência exclusiva da União legislar acerca dessa matéria.
V - Ação direta parcialmente procedente. (ADI 2875, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 04/06/2008, DJe-112 de 20.06.2008)
Igualmente, o Supremo Tribunal Federal sedimentou entendimento no Tema com Repercussão Geral nº 917 de que:
“Não usurpa competência privativa do Chefe do Poder Executivo lei que, embora crie despesa para a Administração, não trata da sua estrutura ou da atribuição de seus órgãos nem do regime jurídico de servidores públicos (art. 61, § 1º, II,"a", "c" e "e", da Constituição Federal).”
Destaque-se ainda que a autorização prevista no presente projeto de lei não é irrestrita. Exige-se nesta legislação que seja apresentado atestado médico contendo a descrição pormenorizada do problema de saúde do paciente e explicação médica da necessidade do uso da medicação para o caso concreto. O atestado deve a estar acompanhado de receita médica indicando a posologia da cannabis medicinal o tratamento do paciente.
Informa-se, por fim, que os estados do Rio Grande do Norte (Lei nº 11.055/2022), São Paulo (Lei nº 17.618/2023) e Paraná (Lei nº 21.364/2023) sancionaram leis sobre a mesma matéria, todas de iniciativa parlamentar. Em Pernambuco, temos a Lei nº 18.124/2022 que versa sobre cultivo e o processamento da cannabis spp para fins medicinais, veterinários e científicos de autoria do deputado João Paulo Lima.
Em vista do exposto e dada a relevância do tema, solicito o apoio dos Pares na tramitação e aprovação da presente proposição.
Histórico
Luciano Duque
Deputado
Informações Complementares
Status | |
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Situação do Trâmite: | AUTOGRAFO_PROMULGADO |
Localização: | SECRETARIA GERAL DA MESA DIRETORA (SEGMD) |
Tramitação | |||
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1ª Publicação: | 04/04/2023 | D.P.L.: | 28 |
1ª Inserção na O.D.: |
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Tipo | Número | Autor |
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Substitutivo | 1/2024 |