Publicado em 28/07/2017 - 14:07

Novo endereço da Casa de Todos os Pernambucanos

Instituição que atravessou regimes políticos e constituições se renova com vistas à transparência e aos anseios populares

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PRINCIPAIS MUDANÇAS - “Espaço mais aberto, mais confortável e com mais oportunidade de participação popular”, destaca presidente da Alepe, Guilherme Uchoa. Foto: Breno Laprovitera

PRINCIPAIS MUDANÇAS – “Espaço mais aberto, mais confortável e com mais oportunidade de participação popular”, destaca presidente da Alepe, Guilherme Uchoa. Foto: Breno Laprovitera

 

Regina Guerra

Uma construção moderna e totalmente acessível. A partir de agosto de 2017, o Parlamento Estadual passa a funcionar no Edifício Governador Miguel Arraes de Alencar, localizado na Rua da União, por trás do palácio que abrigou, por 142 anos, as atividades da Assembleia Legislativa de Pernambuco.

Apesar da pequena distância entre os endereços, o primeiro-secretário da Casa, deputado Diogo Moraes (PSB), garante que a mudança representa um grande salto não apenas em termos de conforto, mas de funcionalidade. “Todo o processo legislativo vai ganhar agilidade. Um programa permitirá que os gabinetes produzam requerimentos, indicações e outros documentos em tempo real, durante as sessões. Além disso, cada deputado e chefe de gabinete terá uma assinatura eletrônica para trabalhar de qualquer lugar do mundo. É o plenário mais moderno do País”, detalha.

294Lugares serão disponibilizados na galeria para que o público possa acompanhar as reuniões.

Denominado “Governador Eduardo Henrique Accioly Campos”, o espaço conta com um painel eletrônico que vai registrar todas as atividades parlamentares. O equipamento está conectado às bancadas dos legisladores, que são informatizadas e com controle biométrico.

As reuniões podem ser acompanhadas pelo público a partir de uma galeria com 294 lugares. Cadeiras adaptadas para pessoas com deficiência, com mobilidade reduzida e obesos, rampas de acesso e elevadores garantem a acessibilidade. Uma cúpula de aço, alumínio e vidro com proteção solar permite aproveitar a luz natural. A iluminação do prédio, toda em LED e automatizada, foi projetada para reduzir o consumo de energia.

Além do Plenário, o prédio abriga três plenarinhos, onde serão realizados os encontros das comissões técnicas. Auditório, salas de reunião e de apoio administrativo completam o espaço, que conta, ainda, com estacionamento para 75 veículos. A área total é de 5.715 metros quadrados, com projeto do arquiteto Carlos Fernando Pontual.

ARQUITETURA - Carlos Fernando Pontual assina projeto do novo edifício-sede Governador Miguel Arraes de Alencar. Foto: Rinaldo Marques

ARQUITETURA – Carlos Fernando Pontual assina projeto do novo edifício-sede Governador Miguel Arraes de Alencar. Foto: Rinaldo Marques

“Estava na hora de dar ao povo de Pernambuco melhores condições para acompanhar o trabalho legislativo. É um espaço mais aberto, mais confortável e com mais oportunidade de participação popular”, comemora o presidente da Alepe, deputado Guilherme Uchoa (PDT).

Histórico – Desde 1875, o Palácio Joaquim Nabuco sediou o Poder Legislativo estadual, atravessando regimes políticos e constituições como local em que os representantes do povo se reuniam para discutir leis e repercutir assuntos de interesse nacional. Também foi endereço para a manifestação dos mais variados grupos.

A historiadora Suzana Cavani, professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), lembra que a criação das então chamadas assembleias provinciais ocorreu por Ato Adicional feito pelos liberais à Constituição do Império, em 1824. A iniciativa representou certo aumento de poder para os governos locais no regime altamente concentrador que então se vivia.

Até 1881, as eleições eram indiretas: quem possuísse a renda exigida poderia votar naqueles que escolheriam os representantes finais. “Era um sistema bem controlado que gerava bancadas atenuadas em termos de radicalismo, mas isso não quer dizer que não existissem pessoas que representassem os interesses populares”, analisa a pesquisadora. “Além disso, a população organizada quebra o parâmetro. Se não elegia, pressionava com movimento de ruas, se dirigia para Assembleia. O povo vai além do estabelecido e abre novos canais”, completa. A autorização legal para peticionar representou o início da luta por direitos sociais.

Quanto às atribuições, a historiadora conta que as assembleias estaduais só se tornaram instâncias menos limitadas com a República, proclamada 14 anos depois da transferência do Parlamento Estadual para o Palácio. “Durante o Império, havia o poder de veto do chefe do Executivo. A capacidade tributária era muito limitada, os principais impostos de importação e exportação eram da alçada central”, descreve Suzana. Nesse cenário, a Assembleia funcionou mais como elo dos interesses locais e nacionais, mesmo porque muitos deputados provinciais eram também deputados gerais – o que equivaleria, atualmente, ao cargo de deputado federal. “A história da Assembleia foi de luta não só do povo, mas também como instituição que marca o poder federativo”, resume a especialista.

A Proclamação da República, em 1889, trouxe mais autonomia e novas atribuições para as assembleias legislativas. Em 1891, acontecem as sessões preparatórias para a promulgação da primeira Constituição Política de Pernambuco.

“As assembleias estaduais só se tornaram instâncias menos limitadas com a República, proclamada 14 anos depois da transferência do Parlamento Estadual para o Palácio Joaquim Nabuco.”

Suzana Cavani, historiadora

Durante o período republicano, as ditaduras constituíram um capítulo à parte. Na Era Vargas, a Casa esteve fechada de 1937 a 1945. De 1964, o arquivo da Alepe guarda o projeto de resolução que considera vago o cargo de governador de Pernambuco, então ocupado por Miguel Arraes. Com a redemocratização, Arraes volta à Assembleia para tomar posse como governador. Estava na condição de chefe do Executivo quando foi promulgada a atual Constituição Estadual, em 1989.

No campo das discussões, a questão abolicionista merece destaque (ver Documento Histórico). Os arquivos da Superintendência de Preservação do Patrimônio Histórico do Legislativo guardam petições, leis e transcrições de debates. Um exemplo, ainda da década de 1870, é a norma que criou um fundo estadual para a emancipação de escravos, os quais, a partir da Lei do Ventre Livre, passaram a poder comprar a liberdade. Os deputados destinaram recursos de loterias, doações e multas para a finalidade.

“O Legislativo pernambucano sempre foi conhecido por representar grandes lutas e debates”, avalia Priscila Lapa, doutora em Ciência Política pela UFPE. Na opinião da pesquisadora, entretanto, o modelo instituído pela Constituição Federal de 1988 impõe restrições que têm “engessado” o papel de legislar. “Houve a distribuição dessa tarefa com o Executivo, porque, naquele momento, após um regime de exceção, era importante desconcentrar. Hoje, é preciso repensar o Parlamento para que seja a porta de entrada das questões que a sociedade enfrenta. É o Legislativo que representa, em sua essência, a multiplicidade social”, conclui.

Durante a última Reunião Ordinária Plenária realizada no Palácio Joaquim Nabuco, no dia 29 de junho, parlamentares lembraram de suas trajetórias e da relação afetiva com o prédio. Nomes como o de Adalgisa Cavalcanti, a primeira mulher na Alepe, mereceram destaque. O deputado Henrique Queiroz (PR), que está no décimo mandato consecutivo, aprovou a transformação do espaço em museu. “Será uma oportunidade para que turistas do mundo inteiro possam conhecer nossa história. Uma parte da minha vida está aqui: são 40 anos fazendo esse trabalho bonito que é a política”, disse.

“Esta Casa marcou a vida de muitos políticos, inclusive a minha”, concordou o presidente da Alepe, durante a cerimônia que encerrou as atividades na antiga sede. De acordo com Guilherme Uchoa, mesmo com a inauguração do novo plenário, algumas sessões especiais e solenidades continuarão a ser realizadas no Palácio.

Veja a galeria de fotos

  • No Plenário Governador Eduardo Henrique Accioly Campos, painel eletrônico registra a atividade parlamentar. As bancadas são informatizadas e possuem controle biométrico. Foto: Breno Laprovitera
  • Da galeria, 294 pessoas podem acompanhar as reuniões plenárias. O espaço dispõe de cadeiras adaptadas para pessoas com deficiência, mobilidade reduzida e obesos. Foto: Breno Laprovitera
  • Comissões temáticas se reúnem nos três plenarinhos, que comportam deputados e assessores na mesa, além de espaço para o público. Foto: Roberto Soares
  • O novo auditório da Alepe pode receber até 142 pessoas. Foto: Roberto Soares

Homenagens –  “Meu pai já recebeu muitas homenagens, mas essa é especial, porque é da Casa do Povo”, garantiu o médico Luiz Cláudio Arraes, filho do ex-governador Miguel Arraes, durante a cerimônia de inauguração do prédio que leva o nome do político, na tarde da última quinta-feira de junho. Representando a família na solenidade, ele rememorou a trajetória do pai, cearense de nascimento, mas que construiu carreira política em Pernambuco: foi deputado estadual, federal e prefeito do Recife, além de ter sido eleito para governar o Estado por três vezes.

João Campos, filho do ex-governador Eduardo Campos, morto em 2013, também se disse honrado com a homenagem ao pai, “um pernambucano que deu a vida ao serviço público”, no novo plenário.

A sede da Assembleia foi inaugurada logo depois da cerimônia que encerrou as atividades do Palácio Joaquim Nabuco. Além das famílias dos homenageados, o evento contou com a presença do governador Paulo Câmara, do presidente do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), Leopoldo Raposo, e do presidente do Tribunal de Contas do Estado (TCE-PE), Carlos Porto, bem como do prefeito do Recife, Geraldo Julio, e do vice-governador Raul Henry. O senador Fernando Bezerra Coelho (PSB) e o deputado federal Eduardo da Fonte (PP) representaram, respectivamente, o Senado Federal e a Câmara dos Deputados.