
PROJETO DE LEI ORDINÁRIA 409/2019
Altera a Lei nº 16.600, de 1º de julho de 2019, que dispõe sobre a proteção do consumidor pernambucano em relação às práticas abusivas por parte de prestadoras de serviços de telecomunicações, para proibir a cobrança de multa contratual de fidelidade aos usuários que comprovarem a perda do vínculo empregatício.
Texto Completo
Art. 1º Acrescenta dispositivo à Lei nº 16.600, de 1º de julho de 2019, com o seguinte teor:
“Art. 4º-A. Ficam as empresas de serviços de telecomunicações proibidas de cobrarem multa contratual de fidelidade quando o consumidor comprovar que se encontra desempregado, tendo a perda do vínculo empregatício ocorrida após a adesão do contrato de prestação de serviço.” (AC)
Art. 2º Esta Lei entra em vigor após 90 dias de sua publicação.
Justificativa
Apresentamos o presente Projeto de Lei, para deliberação desta Egrégia Assembleia Legislativa, cuja competência legislativa encontra respaldo no art. 19, da Magna Carta do Estado de Pernambuco, e no art. 194, I, do Regimento Interno desta Casa, uma vez que seu conteúdo não esbarra no rol de matérias a qual a iniciativa é reservada privativamente ao Governador do Estado.
Nesse sentido, cumpre salientar que sob o aspecto financeiro e orçamentário, a execução normativa desta iniciativa não implicará em aumento de despesas para o Poder Público, e nem implicará na criação de atribuições para Secretarias de Estado, órgãos e entidades da administração pública.
Ademais, a proposição não viola os limites estabelecidos pela Constituição Federal, no que tange a competência remanescente dos Estados-membros para legislar sobre matérias que não foram incluídas nas competências enumeradas ou implícitas da União e dos Municípios, bem como não incidam nas vedações constitucionais que balizam a atuação dos entes federados, conforme previsto no §1º do art. 25 da Constituição Federal.
No que tange à matéria do projeto, temos que a medida busca uma alteração na Lei nº 16.600, de 1º de julho de 2019, para incluir previsão normativa que proíbe a cobrança de multa contratual de fidelidade, quando o consumidor/usuário comprovar que se encontra desempregado, tendo a perda do vínculo empregatício ocorrida somente após a adesão do contrato de prestação de serviço.
Inexiste óbice à iniciativa parlamentar, pois a hipótese não se enquadra nas regras de atribuição privativa do Governador do Estado para deflagrar o processo legislativo, previstas no art. 19, § 1º, da Constituição do Estado de Pernambuco.
Cumpre, também, afastar a tese de que esse projeto gozaria de vício de inconstitucionalidade por violar o art. 22, IV, da Constituição Federal. Esse dispositivo fixa a competência privativa da União para legislar sobre “água, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão”, a quem também compete explorar esses serviços diretamente ou estabelecer regras para sua exploração por terceiros, mediante autorização, concessão ou permissão (art. 21, XI).
De fato, o monopólio sobre os serviços públicos de telecomunicações pertence à União – ainda que a atividade seja delegada a particulares mediante autorização, concessão ou permissão – e somente a ela cabe dispor acerca do seu regime de exploração (“organização dos serviços”), aí incluída a sua forma de remuneração – e a própria Constituição confirma, no art. 175, III, que as regras componentes da política tarifária são parte integrante do regime de prestação do serviço público.
Temos, portanto, que a relação jurídica entre o usuário do serviço de telecomunicação e a empresa prestadora é trilateral, visto que envolve, além desses dois sujeitos, o próprio Poder Público, legítimo titular do serviço e a quem compete a definição dos parâmetros técnicos e econômicos da sua prestação. No entanto, o vínculo da prestadora com o usuário também ostenta uma dimensão típica das relações de consumo – sendo sujeitas, nessa medida, aos princípios e normas de proteção aos direitos e interesses do consumidor.
O Supremo Tribunal Federal vem se posicionando, acerca dessa matéria, da seguinte forma:
[...] para determinar se a norma impugnada invade ou não a competência da União, é necessário examinar se os efeitos da medida se esgotam na relação entre o consumidor-usuário e o fornecedor-prestador do serviço público, ou se, ao contrário, interferem, para além dessa dimensão, na relação jurídica existente entre esses dois atores e o Poder Concedente, titular do serviço. (ADI nº 4.908/RJ).
In casu, temos que a proposição limita-se a atuar exclusivamente na esfera consumerista. A matéria encontra-se inserta na esfera de competência da União, dos Estados e do Distrito Federal, conforme estabelece o art. 24, incisos V e VIII, da Constituição Federal, para legislar concorrentemente sobre “produção e consumo” e fixar regras de responsabilidade por dano ao consumidor.
A chamada multa contratual de fidelidade consiste em cláusula penal que, acompanhando instrumento de adesão ao serviço, onera o usuário com a permanência do vínculo com a prestadora por prazo determinado, como contrapartida pelo oferecimento de determinado benefício.
Não incide, portanto, sobre o contrato de prestação de serviço em si, mas sim sobre o pacto paralelo, notadamente a aquisição de algum produto ou serviço com valor inferior ao praticado no mercado.
No art. 40, § 4º, do Anexo à Resolução nº 477/2007 (Regulamento do Serviço Móvel Pessoal – SMP) – a ANATEL esclarece que o instrumento pelo qual a prestadora de serviços de telefonia oferece benefícios aos seus usuários, exigindo, em contrapartida, que permaneçam a ela vinculados por um prazo mínimo, não se confunde com o Termo de Adesão ao Plano de Serviço aderido pelo usuário, tampouco o integra, sendo de caráter comercial e regido pelas regras previstas no Código de Defesa do Consumidor – Lei nº 8.078/1990.
A alteração que propomos em nada interfere no regime de exploração ou na estrutura remuneratória da prestação dos serviços de telecomunicação, cujo regramento compete, nos termos dos arts. 21, XI, e 22, IV, da Constituição Federal, à União, que disciplina a matéria nos arts. 19, VII, 93, VII, 103 a 109 e 120, III, da Lei 9.472/1997.
Logo, este Projeto de Lei visa a proteção do usuário na condição de consumidores, ou seja, aponta para a relação jurídica tipicamente consumerista, ainda que realizada paralelamente a contrato de prestação de um serviço de telecomunicação.
Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal se manifestou, em recente julgado, pela constitucionalidade da Lei Estadual nº 6.295/2012, do Rio de Janeiro, que trata de idêntica matéria (ADI nº 4.908/RJ). In verbis:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI Nº 6.295/2012 DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. PRESTADORAS DE SERVIÇOS DE TELEFONIA FIXA E CELULAR. HIPÓTESE DE CANCELAMENTO DA MULTA CONTRATUAL DE FIDELIDADE. ALEGADA USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO PARA LEGISLAR SOBRE EXPLORAÇÃO DE SERVIÇOS DE TELECOMUNICAÇÕES. AFRONTA AOS ARTS. 1º, 21, IX, 22, IV, E 175 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. INOCORRÊNCIA.
1. A chamada multa contratual de fidelidade – cláusula penal que, acompanhando instrumento de adesão a serviço de telefonia, onera o usuário, como contrapartida pelo oferecimento de determinado produto ou benefício, com a permanência do vínculo com a prestadora por prazo determinado – não incide sobre o contrato de prestação de serviço de telefonia propriamente dito, e sim sobre pactuação paralela, notadamente a aquisição de estação móvel (aparelho de telefonia celular) ou outro dispositivo mediante valor inferior ao praticado no mercado. O instrumento pelo qual a prestadora de serviços de telefonia oferece benefícios a seus usuários, exigindo, em contrapartida, que permaneçam a ela vinculados por um prazo mínimo, não se confunde com o termo de adesão do usuário a plano de serviço de telecomunicações, tampouco o integra, consubstanciando típica relação de consumo.
2. Ao impor o cancelamento da multa contratual de fidelidade quando o usuário de serviços de telefonia celular ou fixa comprovar que perdeu o vínculo empregatício após a adesão ao contrato, a Lei nº 6.295/2012 do Estado do Rio de Janeiro disciplina relação jurídica tipicamente consumerista, ainda que realizada paralelamente a contrato de prestação de serviço de telefonia. Os efeitos da medida esgotam-se na relação entre o consumidor-usuário e o fornecedor-prestador do serviço público, não interferindo no conteúdo dos contratos administrativos firmados no âmbito federal para prestação do serviço público.
3. Implementada norma de proteção ao consumidor que, rigorosamente contida nos limites do art. 24, V, da Carta Política, em nada interfere no regime de exploração, na estrutura remuneratória da prestação dos serviços ou no equilíbrio dos contratos administrativos, inocorrente usurpação da competência legislativa privativa da União, e, consequentemente, afronta aos arts. 1º, 21, IX, 22, IV, e 175 da Constituição da República.
- Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente.
(STF, ADI nº 4.908/RJ, Rel. Min. Rosa Weber, DJE 06/05/2019).
Ademais, há precedentes da Comissão de Constituição, Legislação e Justiça desta Nobre Casa Parlamentar, em declarar a constitucionalidade e legalidade de Projeto de Lei de iniciativa parlamentar que fixa normas de Direito do Consumidor: Parecer nº 7275/2018 ao PL nº 1512/2017. Bem como, em proposição que visa regular os serviços de telecomunicações no âmbito do Estado de Pernambuco: Parecer nº 446/2019, ao PL nº 273/2019.
Ressaltamos, por fim, que a iniciativa em comento tem respaldo, no seu mérito, no sistema de proteção consagrado pelo Código de Defesa do Consumidor, cujo art. 6º, inciso V, assegura, como direito básico do consumidor: “a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas”.
Do fim de 2018 até o primeiro trimestre deste ano, Pernambuco esteve entre as unidades federativas com maior número de demissões. Em dezembro de 2018, já eram mais de 650 mil desempregados, um índice superior aos 15% da população, de acordo com o IBGE. E de acordo com a Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio (Pnad contínua), em 2019, o Brasil encontra-se com aproximadamente 12 milhões e 800 mil desempregados, número que cresceu desde janeiro, quando eram 12,2 milhões sem trabalho.
Nossa proposição visa, assim, assegurar que o consumidor/usuário supervenientemente desempregado não seja obrigado a permanecer em uma relação contratual onerosa, sendo impelido a continuar consumindo um serviço o qual é impossibilitado de arcar. A manutenção forçada desse tipo de cláusula apenas contribuiria para o superendividamento da população, o que em nada contribui para os avanços econômicos e a retomada do crescimento nacional.
Diante de tais considerações, não havendo comprovado vício de inconstitucionalidade ou ilegalidade, estando presente o interesse público que motiva e legitima este projeto de lei, solicito o valoroso apoio dos Nobres Parlamentares desta Assembleia Legislativa para sua aprovação.
Histórico
Delegada Gleide Angelo
Deputada
Informações Complementares
Status | |
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Situação do Trâmite: | DISTRIBU�DO PARA COMISS�O |
Localização: | SECRETARIA GERAL DA MESA DIRETORA (SEGMD) |
Tramitação | |||
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1ª Publicação: | 06/08/2019 | D.P.L.: | 11 |
1ª Inserção na O.D.: |